São Paulo, domingo, 12 de março de 2000


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AMAZÔNIA
Equipe do médico Drauzio Varella utiliza conhecimentos de um mateiro e já recolheu 40 plantas
Expedição busca cura para câncer e Aids

ANDRÉA DE LIMA
da Agência Folha, em Novo Airão

Uma expedição da Unip (Universidade Paulista) na floresta amazônica catalogou, em apenas três dias, 40 plantas que podem conter princípios ativos para o tratamento de doenças, particularmente câncer e Aids.
Coordenada pelo médico Antonio Drauzio Varella, 56, a viagem se utilizou largamente dos conhecimentos do mateiro Luiz Fernandes Coelho, que identificou a maior parte das plantas.
Criado há quatro anos, a um custo de US$ 1 milhão, o projeto na Amazônia produz mensalmente, segundo a universidade,150 extratos vegetais.
"Fazemos oito viagens ao rio Negro por ano. Ainda não chegamos a um princípio ativo, que é a base de composição de remédios", afirmou Riad Younes, 40, oncologista e professor da Unip.
Segundo o presidente-executivo da Abifarma (Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica), José Eduardo Bandeira de Mello, o processo de desenvolvimento de um medicamento pode durar de 10 a 15 anos.
A última expedição da universidade, realizada entre os dias 24 e 27 de fevereiro e acompanhada pela Agência Folha, é uma das quatro organizadas no Brasil e no exterior desde dezembro passado, segundo o Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis). De acordo com dados do órgão, apenas 10% das expedições do gênero são legais, como a da Unip.
A região amazônica vem sendo rastreada por pesquisadores da universidade desde 96, logo depois da criação da OMC (Organização Mundial do Comércio), em 94, que legalizou a questão da patente para princípios ativos encontrados na natureza.
Boa parte do trabalho dos pesquisadores é recuperar o conhecimento empírico acumulado pelas populações locais e, baseados nele, achar pistas de princípios que, patenteados, podem valer muito no mercado mundial.
Na expedição de Varella, composta pelo coordenador, Wilson Malavazi, o botânico Alexandre de Oliveira, 33, e a farmacêutica Ivana Suffredini, 32, o mateiro Luiz Coelho é o homem-chave.
Aos 71 anos de idade, ele é o principal elo entre os cientistas e a floresta. Ex-funcionário do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), o seu Luiz -como é chamado pelo grupo- identifica há 40 anos as plantas típicas da região. Apesar de não ter o primeiro grau completo, ele sabe os nomes científicos, em latim, das plantas e o uso medicinal que os caboclos fazem delas.
"Já identifiquei mais de 22 mil plantas. Nem sei quantas conheço e quais eu mais gosto. É o que sei fazer melhor na vida. Já ensinei e aprendi com botânicos do mundo todo", disse o mateiro.
Os vegetais são colhidos em terra firme ou, em épocas de cheia do rio Negro, em matas de igapós. O principal trecho da coleta se dá entre Manaus e Novo Airão, a 200 km da capital amazonense.
A água escura do rio deve-se ao acúmulo de ácidos húmicos, produto da decomposição dos restos vegetais que caem nos solos arenosos e são levados até o rio.
Nos três dias de coleta, Coelho saiu à frente da equipe nas entradas de picadas. Ele logo reconhece as árvores e as descreve em latim. A abundância de formigas e carapanãs (pernilongos) só não incomoda o mateiro, que usa um podão (espécie de tesoura de metal), um facão e uma lupa como instrumentos de trabalho.
No primeiro dia de coleta, os cientistas colheram 15 exemplares de plantas. Parte deles foi levada para o barco, picada e colocada em sacos de algodão, com suas fichas de identificação.
Outra parte foi armazenada entre folhas de jornal e prensadas em uma pasta de madeira, para compor o herbário. No laboratório do barco da Unip, o material ensacado foi secado em estufa.
No laboratório da universidade em São Paulo, o material coletado é transformado em extrato para ser testado em animais e comprovar seu potencial de cura.


A jornalista Andréa de Lima e o repórter-fotográfico Evelson de Freitas viajaram a convite da Unip


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