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SEGURANÇA
Para entidades e advogados que formam grupo Antiterror, legislação mais rígida é incapaz de reduzir criminalidade
Movimento quer barrar lei penal mais dura
GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um manifesto que será entregue hoje ao ministro da Justiça,
Márcio Thomaz Bastos, marca o
começo da campanha pública do
chamado Movimento Antiterror,
formado por profissionais e entidades na área do direito de seis
Estados e de Brasília.
É a primeira reação organizada
contra as propostas de endurecimento da legislação penal e do
tratamento dado aos presos brasileiros como forma de combater a
criminalidade.
Tramita no Congresso projeto,
por exemplo, que amplia o tempo
que um detento pode ficar em
uma solitária, incomunicável e
sem contato com o ambiente fora
da cadeia (leia texto abaixo).
O grupo Antiterror é formado
por ex-ministros da Justiça, advogados criminalistas de renome,
promotores de Justiça, magistrados, professores e também por
entidades ligadas à área. A campanha, deflagrada via internet,
tem a adesão de profissionais de
São Paulo, Rio de Janeiro, Minas
Gerais, Paraná, Rio Grande do
Sul, Pernambuco e Brasília.
Segundo o próprio movimento,
mais de 240 profissionais e dez
entidades participam da reação às
propostas que tramitam no Congresso. As novas idéias são traduzidas pelo grupo como "ilusão penal" e "cortina de fumaça". Para
eles, o endurecimento não diminuirá a criminalidade e poderá até
causar efeito contrário.
O manifesto é o começo da
campanha pública de um movimento que nasceu no final de
abril, em uma reunião em São
Paulo. Depois disso, 20 representantes do grupo se encontraram
com o ministro da Justiça em seu
escritório oficial na capital paulista, na última segunda-feira.
A conversa revelou que a batalha será difícil. Bastos disse que a
pressão de parcela do Congresso e
do próprio PT é muito forte em
favor do endurecimento da legislação. O grupo de especialistas
quer que o ministro adie a votação no Senado.
"O endurecimento á uma ilusão
penal. É um biombo que esconde
o assunto principal, que é a política social", disse Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça e professor da Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo. A Lei
de Crimes Hediondos, de 1990, é o
exemplo mais citado pelo grupo
para defender a tese de que lei
mais rígida não diminui criminalidade. "De lá para cá, os crimes só
aumentaram", disse Reale Júnior.
Para o movimento, a ação do
governo tem de ser direcionada
para políticas de combate à corrupção, reaparelhamento das polícias e projetos sociais. "Essa proposta é a legítima legislação penal
do pânico para acalmar a opinião
pública", afirmou Marcelo Leonardo, presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil de Minas
Gerais e professor na Universidade Federal de Minas Gerais.
Inspirador
Autor do nome do movimento,
o professor da Universidade Federal do Paraná e presidente do
grupo brasileiro da Associação
Internacional de Direito Penal,
René Ariel Dotti, diz estar surpreso com a mobilização rápida dos
profissionais contrários às propostas. "O movimento é muito espontâneo. A última vez que isso
ocorreu no setor foi no impeachment de Collor de Mello."
Dotti resolveu batizar a mobilização como Movimento Antiterror a partir da obra do político e
filósofo italiano Giuseppe Bettiol,
que entre as décadas de 50 e 70 se
notabilizou ao definir como "terror penal" as situações em que a
Justiça é aplicada como uma espécie de vingança. "Crime organizado e Estado desorganizado são irmãos xifópagos", disse, comparando ambos com aqueles indivíduos que, embora diferentes, estão ligados pelo mesmo tórax.
Para o advogado criminalista
Arnaldo Malheiros Filho, o endurecimento da legislação não passa
de um "estelionato eleitoral".
"Um político, que não sabe nada
do tema, chega ao Congresso e faz
alterações malucas. É preciso ouvir os especialistas", disse.
Apesar de a entidade a qual preside, a Associação Juízes para a
Democracia, ainda não integrar
oficialmente o movimento, o juiz
do Tribunal de Alçada Criminal
de São Paulo, Ary Casagrande,
também critica a proposta do governo. "Essa não é a solução. Não
se faz Justiça baseada no clamor
público", afirmou.
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