São Paulo, segunda-feira, 12 de agosto de 2002

Próximo Texto | Índice

LAR, DOCE LAR?

Prefeitura tem 120 dias para atestar boas condições de estrutura e saneamento em prédios erguidos por Maluf e Pitta

Justiça ordena vistoria em Cingapuras

Eduardo Knapp/Folha Imagem
No Cingapura Chácara Bela Vista, que fica prensado entre a marginal Tietê e suas alças de acesso, os moradores só podem sair do conjunto correndo pela marginal


SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Tribunal de Justiça determinou que a Prefeitura de São Paulo submeta à análise da fiscalização todos os 39 conjuntos do Projeto Cingapura -plano de verticalização de favelas que virou bandeira das administrações de Paulo Maluf (PPB) e Celso Pitta (PSL).
O município tem 120 dias para cumprir a decisão a contar de sua notificação -que deve ocorrer esta semana- sob pena de ver suas autoridades processadas por improbidade administrativa.
Aos órgãos fiscalizadores cabe analisar as condições dos prédios nos quesitos estrutura, urbanização, saneamento e saúde pública.
Os fiscais são: secretarias de Habitação e Saúde, Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Cetesb (Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental), Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), Corpo de Bombeiros e Eletropaulo (Eletricidade de São Paulo).
A maior parte deles integra o Grupo de Análise de Projetos Habitacionais (Graprohab), criado pelo governo estadual em 1991 para "centralizar e agilizar a tramitação de projetos habitacionais".
Pela lei, como o próprio nome do grupo já diz, o Graprohab deveria ter feito as análises antes da construção dos prédios, o que não ocorreu, segundo a Promotoria de Habitação e Urbanismo.

Esgoto e atropelamentos
Sem laudos, os prédio do Cingapura apresentam os mais variados riscos. O da Imigrantes, por exemplo, fica tão perto da avenida que um dos apartamentos térreos já foi invadido por um carro.
Na Chácara Bela Vista -prensada entre a marginal Tietê e suas alças-, o índice de atropelamentos é o maior da cidade entre os locais nos quais não deveria haver travessia de pedestres, pois os moradores só podem sair do conjunto correndo pela marginal.
Perto dali, no Parque Novo Mundo (zona norte), apesar de o contrato de financiamento com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) prever que um dos critérios de priorização de favelas deveria ser a proximidade das redes de infra-estrutura, os prédios despejam esgoto bruto nos córregos que os cercam.
Ontem, a Folha revelou que 14 dos 39 prédios do Cingapura -cuja construção foi iniciada por Maluf e Pitta- foram erguidos sobre lotes de propriedade privada, dos quais a prefeitura não tinha a posse, o que é ilegal.
Agora, a Promotoria afirma que eles não têm garantias de segurança estrutural e ambiental. As falhas podem caracterizar crime de loteamento clandestino, com até quatro anos de prisão.
A falta de propriedade das áreas está na raiz da ausência de aprovação dos empreendimentos, pois a regularização fundiária é, segundo o Ministério Público, uma das exigências para que os órgãos fiscalizadores aprovem os projetos. Pior: alguns dos riscos aos quais estão expostos os moradores dos prédios têm relação direta com o local onde foram construídos os empreendimentos -em áreas privadas, às margens de grandes avenidas.

Ministério Público
"Não ter essas licenças é como andar com um carro sem licenciamento. Com o agravante de que, nesse caso, o licenciamento é o procedimento que comprova o respeito ao consumidor [os moradores"", exemplifica o promotor da Habitação João Lopes Guimarães Jr..
"Tudo isso deixa claro que o poder público não respeita as leis [federal 6.766/79 e municipal 9.413/81" que deveria fiscalizar."
O Ministério Público Estadual moveu a ação contra a prefeitura em fevereiro de 1999. Perdeu em primeira instância, mas recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que, no final do ano passado, reviu a sentença. Há duas semanas, informado da decisão, o promotor Guimarães Jr. pediu que a prefeitura fosse notificada.
A administração municipal -hoje comandada pelo PT- pode recorrer da decisão ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), mas o eventual recurso não tem efeito suspensivo.



Próximo Texto: Outro lado: Prefeitura admite haver falhas, mas pede mais prazo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.