São Paulo, domingo, 12 de outubro de 1997.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LIVROS
Idéia é estimular diversidade
Rede privada foge do hábito de ler

A professora Lenira Buscato ajuda alunos a montar texto no computador, no colégio Bandeirantes da Reportagem Local

Do lado de lá do universo, no mundo bem equipado, bem pago, bem administrado das escolas particulares, professores motivados fazem avançar o ensino de literatura com seus métodos inovadores.
Na Escola da Vila, no Butantã (zona sudoeste), os alunos raramente são obrigados a ler um livro. Tampouco se exige que demonstrem seus conhecimentos de leitura em provas bimestrais escritas.
O protocolo tradicional é substituído por "rodas de leitura" nas quais tomam parte professores, alunos e o bibliotecário.
Cada participante faz uma exposição sobre um livro que tenha lido e que corresponda ao tema da roda. Em seguida é feito um debate e, ao final, os livros são "postos na roda", circulando entre os participantes até a próxima reunião.
"Desde o maternal a gente traz livro para a escola, formando uma espécie de biblioteca da classe", conta Gabriel Arruda, 15. "Aqui se lê muito. Resumos e resenhas são o nosso forte", completa Guilherme de Cerqueira César, 14.
Há um consenso entre os professores das escolas privadas de que é preciso pôr o aluno em contato com textos que ele não quer ler, para romper vícios e a pobreza de interpretação.
"Estimular o hábito de ler, a leitura pela leitura, é errado. Porque hábito se traduz em costume, em rotina, em acomodação. É preciso provocar sempre o estranhamento, para que o aluno não se adapte à fórmula", explica Maria Lúcia Zoega de Souza, assessora de português da escola Vera Cruz.
"O aluno gostou de policial? Então vamos estudar o policial. Mas, no bimestre seguinte, ele vai ler poesia, crônica etc.", exemplifica.
Nas aulas de português do Colégio Bandeirantes, a sensibilidade estética das crianças é estimulada antes que a leitura comece. A 5ª série dá os primeiros passos no estudo do texto a partir de um livro de pinturas.
Os alunos reproduzem os quadros a seu modo, depois montam e fotografam naturezas mortas e lêem os comentários que escritores fizeram sobre as telas. Findo o processo, acumularam informação e técnica para poder escrever uma resenha completa sobre a obra e debatê-la com os outros colegas em classe.
Também no Bandeirantes a infra-estutura conta a favor do bom ensino. São 14.446 títulos em sua biblioteca, acrescidos de 76 assinaturas de periódicos (inclusive jornais argentinos e norte-americanos), 876 softwares educacionais, hemeroteca e videoteca, que recebem 1.100 consultas eletrônicas diárias. Um software de edição eletrônica projetado por um professor do colégio ajuda os alunos a aprimorar seus textos.
Ainda assim, os docentes da rede particular reclamam da falta de interesse dos estudantes pela leitura.
"Existe uma tendência contínua de empobrecimento de vocabulário. Adotamos 'O Feijão e o Sonho' na 6ª série e os meninos tiveram dificuldade de entender as palavras. Perguntaram até se aquilo era mesmo português", relata Eliane Freitas, do São Luís, sobre o infanto-juvenil de Orígenes Lessa, cuja linguagem é tão "antiquada" quanto aquela falada pelos pais dessas crianças.
Mesmo a Internet, rede mundial de computadores que estaria redimindo a palavra escrita entre os jovens, não entusiasma muito os professores.
"Você já viu a rapidez com que eles lêem aquelas telas? É absorção instantânea de informação, não exatamente leitura", alerta Izeti Torralvo, coordenadora de português do Bandeirantes.
Ainda assim, há aqueles títulos que não falham em atrair o jovem, mesmo o desacostumado ao meio escrito. "Meninos da Rua Paulo", "O Apanhador no Campo de Centeio", "Capitães de Areia" e "Outsiders" tratam de temas caros à adolescência, como identidade, aceitação e comportamento de grupo e são populares há mais de uma geração. (FABRIZIO RIGOUT)



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.