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ARTIGO
Educar é ensinar a conhecer situações de risco
ROSELY SAYÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Tragédias que envolvem
violência contra adolescentes
e jovens e acabam em morte nos
deixam -a todos- em sobressalto. Os pais, em especial, entram
em pânico. É compreensível: "Poderia ter acontecido com meu filho" é o que identificam -e temem- os pais. De imediato, o
impulso tende a ser o de aumentar a proteção em torno dos filhos,
o de apertar o cerco da vigilância,
o de intensificar a tutela sobre a
vida deles.
O fato é que explorar e experimentar a vida em todas as suas
possibilidades, hoje, é muito mais
arriscado. "Viver perigosamente"
deixou de ser uma expressão
charmosa que apontava alguns
comportamentos típicos de adolescentes para tornar-se uma
frase com sentido bem concreto
e ameaçador.
Isso exige, mesmo com a tristeza e a angústia em alta provocadas
pelas notícias, reflexões sobre caminhos educativos antes percorridos sem muita atenção.
Adolescentes sempre mentiram
aos pais para alcançar o que queriam. E vão continuar mentindo.
Os pais de hoje, que já passaram
por essa fase, sabem bem disso. É
um modo de se afirmarem em
seus caminhos, de confrontarem
a autoridade, de buscarem a realização para seus anseios. No mundo atual, aceitar o fato exige atenção redobrada na educação
desde quando os filhos são
bem pequenos.
Agora, é também tarefa importante da educação, tanto da familiar quanto da escolar, ensinar
crianças e adolescentes a saber reconhecer situações de risco para
evitá-las e/ou contorná-las, a procurar construir e usar fatores de
proteção e segurança para se assegurarem de um mínimo de precaução e a identificar fragilidades
para conseguir pedir ajuda ou abdicar de certas vontades.
Um exemplo simples é a maneira de a escola de educação infantil
funcionar atualmente. Em geral,
ela oferece um ambiente quase totalmente seguro, a fim de poupar
a criança de incidentes no período
em que está lá. Com essa nova responsabilidade, a escola deveria
permitir um ambiente com todas
as dificuldades presentes no mundo para que a criança aprendesse
a se defender dos riscos, a se proteger quando necessário e a pedir
ajuda para superar os obstáculos.
Tudo isso é muito mais efetivo
-apesar de também não oferecer
garantia alguma- do que proteger os filhos diretamente, o que
sempre pode acarretar menos autonomia de vida para eles. Além
disso, essa é a tarefa da educação:
preparar para a vida, mesmo que
ela se mostre tão insana quanto
agora, e tutelar discretamente
-mas com rigor- o modo como eles administram seus primeiros passos sozinhos. Isso exige
muito mais dos pais de hoje e torna a tarefa educativa muito mais
trabalhosa. Mas, como é o maior
legado que os pais podem deixar
ao filho, não dá para não encarar.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar
Meu Filho?" (Publifolha)
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