São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 2006

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Milícia de policiais assedia área nobre do Rio

Esquema clandestino de segurança contra traficantes e usuários de drogas foi oferecido por sargento a 45 edifícios na zona sul

Grupos, que também têm bombeiros e agentes de prisões, expulsaram tráfico nos subúrbios, mas exigem taxa de segurança em troca


SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Milícias formadas por policiais, ex-policiais, bombeiros, agentes penitenciários e militares já expulsaram traficantes de comunidades pobres das zona oeste e norte, invadiram e ocuparam 3 das 17 favelas do complexo da Maré (zona norte), começaram a fechar ruas nos subúrbios e agora chegam à zona sul do Rio de Janeiro.
Semanas atrás, síndicos de 45 edifícios do Leme (extremidade esquerda de Copacabana) receberam por escrito a proposta de adotar um esquema de proteção 24 horas por dia.
A proposta, assinada por um sargento aposentado da Polícia Militar, oferece segurança (seis agentes por turno de seis horas) em quatro ruas próximas à favela do Chapéu Mangueira.
O motivo da oferta, de acordo com o documento, é "o grande índice de criminalidade" na área. O policial cita os crimes cometidos: "furto, roubo, tráfico e uso de entorpecentes".
O sargento estipulava o dia 28 passado como data-limite para a aprovação da proposta. Só então diria aos "clientes" o preço da taxa de segurança. Mesmo assim, já estipulava a data do pagamento: entre os dias 15 e 19 de cada mês.
Após consultar condôminos, os síndicos recusaram a proposta e denunciaram o policial, que está sendo investigado pela corporação. Embora aposentado, o sargento trabalha no serviço interno do 9º Batalhão, em Rocha Miranda (zona norte).
Cabe a essa unidade patrulhar parte de Jacarepaguá (zona oeste), região que é uma espécie de paraíso das milícias, onde controlam todas as favelas, exceto Cidade de Deus.
A ação miliciana na zona oeste começou no fim dos anos 70 na favela Rio das Pedras, perto da Barra da Tijuca, a primeira a ter o tráfico expulso. Em troca era cobrada taxa de segurança. A prática se espalhou na região e hoje as milícias substituem o tráfico. Nas zonas norte e oeste, milicianos cobram de moradores e comerciantes por segurança, pelo uso dos serviços de transporte alternativo (van, Kombi, mototáxi), por botijão de gás e pelas ligações clandestinas de TV a cabo, o "gatonet".
Para se estabelecer, a milícia tem representantes nas comunidades, geralmente policiais que moram lá. Com a ocupação, chegam outros milicianos. Os traficantes são ou mortos ou expulsos, segundo relatos.
Assim como o tráfico, a milícia usa o assistencialismo como meio de angariar a simpatia do morador. Nesse final de ano, nas comunidades do Quitungo e Guaporé (zona norte), a milícia anunciou que distribuirá cestas de alimentos no Natal e brinquedos para as crianças.
Conquistados recentemente, a favela do Quitungo e o conjunto Guaporé são conhecidos no subúrbio pela presença ostensiva do grupo miliciano autodenominado "Os Galáticos".
Seus integrantes são policiais e ex-policiais que moravam na área, aproveitaram o enfraquecimento do tráfico para se impor, convidaram colegas com experiência de ações semelhantes em outras áreas e dizimaram os criminosos.
Na região, o comentário é que pelo menos 20 rapazes envolvidos com o tráfico desapareceram. A polícia não confirma; diz que não há registro oficial de desaparecimentos e que nada está sendo investigado.
Na região de Campo Grande, na zona oeste, um outro grupo miliciano se destaca. Eles são conhecidos com "Os Justiceiros". Seu símbolo é o Batman. Os membros da milícia costumam vestir roupas com a estampa do personagem.
Nos carros, pregam adesivos também alusivos ao super-herói. O chefe da milícia, de acordo com os moradores, tem um apelido na região: Mata Rindo; é um policial civil.


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