São Paulo, sexta-feira, 13 de fevereiro de 2004

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ENTORPECENTE

Pelo texto, juiz decide se caso é de tráfico ou de "consumo pessoal"

Câmara aprova fim de prisão para consumidores de drogas

IURI DANTAS
SILVIO NAVARRO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Câmara dos Deputados aprovou ontem, em votação simbólica, o fim da pena de prisão e da obrigatoriedade de tratamento para os usuários de drogas.
O projeto deixa nas mãos do juiz, em vez da polícia, a função de definir se o caso é de tráfico ou de "consumo pessoal". O governo ainda considera tímidas as mudanças e quer incluir na categoria de usuário outras condutas. Como o texto original veio do Senado e foi alterado na Câmara, volta para análise dos senadores.
"Esse projeto não é, certamente, o que alguns imaginavam, porque alguns queriam entrar num debate sobre descriminalização. Mas é um passo importante", disse o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), que relatou a proposta.
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, disse que a descriminalização do usuário é "consenso em direito penal" e "uma atitude sábia", mas não considerou "que esse projeto seja o melhor projeto possível".
Como exemplo do que o governo pretende modificar no Senado, Bastos citou uma "figura intermediária" entre usuário e traficante. "Existe uma figura intermediária, que é aquele usuário que entrega a droga para o amigo experimentar. É difícil achar justo que ele seja punido com o mesmo rigor com que se pune o traficante."
Se a proposta for aprovada pelo Senado, o usuário não precisará ir à delegacia para registro da ocorrência. A PM poderá lavrar um termo, encaminhando o caso diretamente para a Justiça.
Em lugar da pena de seis meses a dois anos de prisão, quem for pego consumindo ou portando drogas poderá ser advertido pelo juiz, ser obrigado a prestar serviços comunitários ou freqüentar curso ou programa educativo por cinco meses. Em caso de reincidência, o período dobra.
Caso não cumpra a determinação judicial, o dependente ficará sujeito à restrição temporária de direitos, como perda da carteira de habilitação, por exemplo.
O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), negou que o projeto sirva de incentivo ao consumo de drogas ao suavizar as punições.
Uma das principais mudanças do texto na Câmara foi a introdução da subjetividade para avaliar quem é traficante ou usuário. O juiz precisa levar em conta o tipo e a quantidade de droga, o local e as circunstâncias da apreensão, a condição social e profissional do usuário. Em caso de dúvidas, pode requisitar perícia médica.
O coordenador de dependência química da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), João Carlos Dias, classifica a mudança como o "calcanhar-de-aquiles" do projeto. "Talvez o mais viável fosse capacitar equipes nos tribunais para subsidiar a decisão do juiz", disse.
Se a Justiça definir o caso como "consumo pessoal", não haverá obrigatoriedade de tratamento. O texto aprovado diz que o juiz poderá, no máximo, "encaminhar" o usuário para internação e obriga União, Estados e municípios a fornecerem atendimento.
"A rede pública não está preparada. Essa questão precisa ser melhor definida", disse Dias.
O projeto recebeu o nome de Sisnad (Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas).


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