São Paulo, domingo, 13 de março de 2011

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ANÁLISE

Se trânsito piora, as pessoas criam formas de lidar com o problema


ATÉ HOJE, SÃO PAULO NÃO PAROU, APESAR DOS CRESCENTES CUSTOS ECONÔMICOS E ANÍMICOS DO TRÂNSITO


HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA

Desde que me conheço por gente, ouço pessoas se queixando dos congestionamentos e dizendo que, mais dia, menos dia, São Paulo vai parar. O fato é que, até hoje, não parou, apesar dos crescentes custos econômicos e anímicos do trânsito paulistano.
A profecia nunca realizada lembra um pouco a versão popularizada (e falsa) da teoria de Thomas Malthus (1766-1834), segundo a qual a produção de alimentos sempre caminharia atrás do crescimento populacional, o que levaria o planeta inexoravelmente a uma catástrofe.
Ambas as previsões fracassam por interpretar os fenômenos como se fossem lineares e unos, quando, na verdade, são complexos, multifacetados e, em alguns aspectos, contam com mecanismos de "feedback" negativo.
Trocando em miúdos, se o trânsito fica muito ruim, as pessoas acabam criando novas formas de lidar com ele. A mais óbvia delas é reduzir ou limitar os seus deslocamentos pela cidade.
Em alguma medida, isso já ocorreu. De acordo com a pesquisa Origem-Destino, realizada pelo Metrô, em 1977 cada cidadão da região metropolitana fazia 2,07 deslocamentos diários, por qualquer meio de transporte. Em 2007, esse número, conhecido como índice de mobilidade, havia caído para 1,95.
Mais importante, o decréscimo ocorreu apesar de altas significativas na escolarização, que cresceu 110% no período, e nos empregos, que aumentaram 140%. Matricular-se num curso ou conseguir um trabalho implica, tipicamente, mais dois deslocamentos diários.
Outro número que subiu ao longo desses 30 anos foi a taxa de motorização (veículos particulares por 1.000 habitantes), que pulou de 135 para 184.
O pequeno milagre tem uma série de pequenas explicações. Elas incluem inovações que mantêm as pessoas em casa, como trabalhar pelo computador e serviços de motoboys e "delivery", e também mudanças no perfil do tráfego, notadamente a distribuição mais homogênea dos congestionamentos ao longo do dia.
Algumas décadas atrás, engarrafamentos ocorriam quase que exclusivamente nos chamados horários de pico. Hoje esse padrão não existe mais. Há problemas de fluidez em praticamente todas as horas do dia e às vezes também de madrugada.
A cidade, contudo, dificilmente irá parar, porque, à medida que o trânsito piora, provoca mudanças comportamentais que buscam contornar o problema. Assim, à parte investimentos inteligentes no transporte, em especial o de massa, tendem a ser úteis medidas que explicitem os custos dos congestionamentos, como é o caso do pedágio urbano.


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