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AMBIENTE
Laudo de 2000 mostra que pesticidas e chumbo foram encontrados na água subterrânea de área residencial da Vila Carioca
Contaminação extrapola limites da Shell
MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao contrário do que a Shell vem
divulgando, a contaminação do
subsolo e das águas subterrâneas
da sua base de estocagem de combustíveis na Vila Carioca (zona
sul de São Paulo) já ultrapassou os
muros da unidade e chegou à área
residencial circunvizinha.
Drins (pesticidas tóxicos que foram produzidos exclusivamente
pela Shell) e chumbo (usado até
meados dos anos 80 como aditivo
da gasolina) em concentrações
até 19 vezes acima do limite de intervenção (além do qual há riscos
à saúde) foram encontrados no
lençol freático abaixo dos quatro
poços de monitoramento que a
empresa perfurou nas ruas Colorado, Auriverde e Xingu.
É o que mostra o relatório "Avaliação Ambiental e Análise de Risco", concluído em setembro de
2000 pela CSD-Geoclok, empresa
contratada pela Shell para avaliar
e remediar o problema ambiental
na Vila Carioca. O documento
consta do processo jurídico que
acompanha a ação civil pública na
qual Shell e Cetesb (agência ambiental estadual) são rés.
O relatório, que tem cerca de
2.000 páginas, ainda está sendo
avaliado pelos técnicos da Cetesb,
mas a agência afirma que vai exigir novos poços de análise nas
proximidades da área da Shell,
para avaliar a extensão do dano.
Os poluentes estão acima dos
parâmetros também num ponto
dentro da área da Shell que fica
praticamente na fronteira com as
casas mais próximas do local.
Tanto os drins como o chumbo
causam danos ao sistema nervoso
e, dependendo do nível e do tempo de exposição, podem provocar
câncer. Segundo toxicologistas
ouvidos pela Folha, o risco é
maior, porém, para quem consome ou consumiu a água subterrânea ou vegetais regados por ela.
Moradores que vivem na rua
Colorado há mais de 50 anos afirmam ter usado água de poços até
meados dos anos 70, período que
coincide exatamente com o auge
da contaminação da área.
O relato é confirmado pela diretora de Recursos Hídricos do
DAEE (Departamento de Águas e
Energia Elétrica do Estado de São
Paulo), Leila Carvalho Gomes. Segundo ela, há ainda um agravante: os poços da região eram rasos,
ou seja, captavam água mais perto
da superfície, onde a concentração de poluentes é maior.
Borras enterradas
Os drins, fabricados por cerca
de 30 anos numa unidade da Shell
Química que se mudou para Paulínia no fim da década de 70, teriam sido enterrados, num trecho
mais alto da base de estocagem de
combustíveis, onde, nos anos 80,
funcionou uma área social da empresa, que já foi desativada.
A contaminação pelos pesticidas só foi descoberta em 98, durante o processo de avaliação ambiental da unidade, em cujo solo
foram enterradas borras de combustíveis contendo chumbo.
Análise da movimentação do
lençol freático feita pela Geoclock
indica que a água da antiga área
social, situada num terreno mais
alto, corre para a rua Colorado e
adjacências, que estão num nível
mais baixo. A Shell sempre sustentou que todas águas subterrâneas corriam no sentido contrário
ao da área residencial, em direção
ao Ribeirão dos Meninos.
Questionada sobre o que afirma
o documento oficial, a empresa
não mudou seu discurso.
A base de estocagem da Shell na
Vila Carioca é o cenário do que
pode ser a maior contaminação
ambiental da cidade de São Paulo.
Além dos pesticidas e do chumbo,
foram encontrados no subsolo e
nas águas subterrâneas de uma
área equivalente a 25 campos de
futebol benzeno, tolueno, xileno e
etilbenzeno, substâncias presentes nos derivados de petróleo.
Ainda não há registro, entretanto,
de que esses produtos tenham
atingido a área residencial.
A Promotoria de Meio Ambiente da Capital estima que a poluição, denunciada em 1993, possa
afetar até 30 mil pessoas num raio
de 1 km da unidade. O geólogo
Antonio Gabriel Inglês, cuja empresa foi a primeira a trabalhar
para Shell no caso da Vila Carioca,
não descarta tal possibilidade.
Concentrações
No poço de monitoramento da
rua Colorado, foi encontrado 0,26
micrograma de aldrin por litro de
água, proporção quase oito vezes
acima do limite dado pela Cetesb
(0,03 micrograma por litro).
No mesmo ponto, único perfurado até agora na via, havia em
2000 uma concentração de chumbo de 0,12 mg por litro, 12 vezes o
padrão, que é de 0,01 mg por litro.
A concentração de dieldrin na
rua Xingu chega a ser 19 vezes
maior que o limite de 0,03 micrograma por litro. A substância foi
encontrada ainda na rua Auriverde (0,1 micrograma por litro). Na
mesma via, que dá acesso à base
da Shell, foi medido 0,08 micrograma de chumbo por litro de
água, oito vezes o limite.
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