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São Paulo, domingo, 13 de julho de 2003

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DANUZA LEÃO

Amor e felicidade

Ela sempre foi uma mulher daquelas: bonita, alegre, divertida, sem cuja presença a festa nunca era tão animada. Sempre teve os homens que quis (e alguns que nem quis tanto assim), mas eis que um dia se apaixonou pra valer.
Se apaixonou e mudou. Começou a se vestir diferente: roupas menos ousadas, pernas mais cobertas, decotes mais pudicos, palavras mais escolhidas. As três vodcas com gelo que contribuíam para fazer dela aquela pessoa tão engraçada e tão solta foram trocadas por um cálice de vinho do porto -um só. Passou a conviver mais com outro tipo de mulheres, aquelas que tinham um homem fixo -que fosse namorado, caso ou marido-, e nunca mais disse nada que provocasse uma gargalhada no grupo. Nem ela mesma gargalhava mais como antes; não contente, ficou ciumenta. Ciumenta, controladora e, consequentemente, chata.
Quando ele olhava para o lado, ela acompanhava com os olhos para saber para que -ou quem- ele estava olhando; se fosse uma mulher bonita, fazia tromba e, na ida para casa, uma cena. Telefonava várias vezes para o escritório, e quando o celular estava desligado submetia o coitado a um interrogatório. No princípio ele ria de seus ciúmes, mas, com o tempo, foi achando menos graça.
Passou a podar os amigos solteiros e sobretudo as amigas companheiras dos tempos de loucura. Ele não percebeu logo -homens são distraídos-, mas pouco a pouco os programas foram mudando: passaram a ser um jantarzinho a quatro, uma reuniãozinha a oito, sempre com pessoas escolhidas a dedo, isto é, que não representassem nenhum risco. Aquela mulher que topava tudo, que às 2h da manhã estava pronta para a saideira em qualquer lugar barra-pesada, só de farra, mudou. Mudou e ficou insuportável, como muitas mulheres muito apaixonadas costumam ficar. Um dia ele não aguentou, e o romance acabou.
Ela sofreu, e como. Fez tudo para voltar: mudou o cabelo, simulou encontros casuais, telefonava de madrugada para saber se ele estava, continuou amiga dos amigos dele, mas não adiantou. Procurou a antiga companheira de todas as horas -e de todas as loucuras- para poder chorar, e chorou. Chorou muito e, seguindo seus sábios conselhos, resolveu partir para qualquer outra, apaixonada ou não.
Voltou a sair com a turma de antes e, aos poucos, foi se dando o direito de voltar a dizer bobagens e a fazer as pessoas rirem, e conseguiu até rir dela mesma. O tempo passou e um dia apareceu um homem; começaram a sair, e quando viu, ele estava apaixonado e a história se repetiu. Só que, dessa vez, foi ele quem mudou.
Aquele homem sedutor, que adorava quando ela se punha toda linda para irem dançar, se transformou. No lugar de saírem com os amigos divertidos e engraçados, passaram a conviver com o irmão dele e a cunhada, que não tinham nada a ver. E começou de novo o filme do ciúme e do controle, só que ao contrário.
Ela adorava se apaixonar, mas nunca dava certo; quando gostava muito -e ela não era de gostar pouco-, se angustiava, nas noites em que não se viam fazia fantasias, achava que o namorado do momento estava com outra e não ia aparecer nunca mais. Mas desta vez o ciumento e controlador era ele; as coisas foram ficando difíceis e ela foi embora pensando que gostar era uma coisa, ser feliz, outra.
E passou a fugir do amor.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br


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