São Paulo, segunda, 13 de julho de 1998

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SAÚDE
Taxa de mortalidade dos médicos nas primeiras 48 horas de internação é cinco vezes maior do que entre outros profissionais
Médico não cuida da própria saúde, diz estudo

MALU GASPAR
da Reportagem Local

Casa de ferreiro, espeto de pau. O velho ditado popular cai como luva sobre a situação dos médicos que passam a ser pacientes.
Uma tese de doutorado aprovada em maio na Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) constatou que os médicos não cuidam da própria saúde como deveriam.
A pesquisa, que coletou dados sobre 183 médicos, engenheiros e advogados que estiveram internados no Incor (Instituto do Coração, em São Paulo), em 1995, constatou que a taxa de mortalidade dos médicos nas primeiras 48 horas de internação é cinco vezes maior do que entre os outros profissionais.
Para a autora do estudo, a psiquiatra Alexandrina Meleiro, do Hospital das Clínicas, essa é a maior prova de que os médicos geralmente negligenciam a própria saúde.
"Esse índice mostra que, quando o médico chega ao hospital, ele já se arriscou tanto e a situação é tão grave que já não é possível fazer mais nada", diz a psiquiatra.
Os dados indicam ainda que, ao contrário do que exigem dos pacientes, eles são os que menos seguem à risca a prescrição médica- 20,8%, contra 90,3% de advogados e 84,5% dos engenheiros.
Além disso, são os que mais têm dificuldade para mudar seus hábitos de vida depois do infarto (veja quadro ao lado).

Onipotência
Para Alexandrina, um dos fatores que faz com que esse comportamento seja adotado é o fato de o médico frequentemente se sentir imune a doenças.
"Essa impressão de que o médico é onipotente, principalmente quando é jovem, é algo difícil de reverter e traz problemas quando vem a doença. Eu também já me senti assim", afirma o cardiologista Mauricio Vajn Garden, professor livre-docente do Incor, que tem pacientes médicos.
A irritação pelo fato de estar doente foi mais sentida pelos médicos do que pelos outros profissionais. Eles são a minoria (37,7%) entre os que afirmam não estar nada irritados com a doença.
A demora em procurar o hospital teve consequências. Apenas 3,7% escaparam de ser submetidos a procedimentos cirúrgicos no hospital, enquanto 15,3% dos advogados e 10,3% dos engenheiros tiveram a mesma sorte.
Na opinião da psiquiatra, cuja clientela é formada na maioria (cerca de 80%) por médicos, é possível estender os resultados da pesquisa para outras situações que não apenas problemas cardíacos. "Antes de escolher o Incor como local da pesquisa, fiz várias entrevistas com pacientes médicos em outros institutos do HC, e as respostas eram muito parecidas."



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