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MARILENE FELINTO
Candidatos da ignorância: Maluf, Collor, Rosinha
A diarista chegou - "diarista" é um eufemismo para
"faxineira" ou "peniqueira", como se dizia lá no Nordeste, sinônimos horríveis para "empregada
doméstica". Ela é dura, calada,
revoltada. Eu, também. Daí nos
darmos bem, cada uma na sua.
Uma amiga minha, professora
brilhante, atarefadíssima, escritora, mãe de dois filhos, sempre se
recusou a ter empregados domésticos de qualquer tipo. "Não
aguento a luta de classes dentro
da minha própria casa", explica.
Não me meto na vida da faxineira. Ela não se mete na minha.
Tudo certo, a não ser porque às
vezes eu a provoco (e porque, às
vezes, ela me pede aumento no
valor da diária).
"Vai votar em quem este ano?",
perguntei. "Em ninguém. Já disse
que não dou confiança a político". É paraibana, mora em Diadema (Grande São Paulo), tem
dois filhos, faz o curso supletivo de
noite.
"E teu marido?", continuei,
querendo briga. Respondeu que o
homem vota em Maluf, candidato ao governo de São Paulo. O
marido trabalha como "entregador" de galões de água mineral e é
semi-analfabeto.
"E você, acha que está certo ele
votar em Maluf?", continuei, cética. Ela disse "é claro que não". E
completou: "Ele só vota no que
não presta. É Maluf, é Collor. Eu
já disse que ele precisa é trabalhar
mais para botar dinheiro em casa. Desse jeito, eu ganhando mais
que ele, não dá."
Preparei-me para um discurso:
"Você sabia que Maluf, Collor,
Garotinho, a mulher dele, Rosinha, são populistas? Sabe o que é
um político populista? É gente
que se aproveita da falta de estudos dos mais pobres para mentir,
fingir que está do lado deles. São
os candidatos da ignorância."
E prossegui: "Por que você não
manda teu marido ir estudar
também? Só assim ele ia enxergar
as coisas como elas são. Por acaso
ele sabe que está fazendo pacto
com o inimigo quando vota nesses populistas? "
Ela estava no alto da escada,
limpando os armários da cozinha, uma expressão tensa no rosto. Continuei: "Você sabia que os
candidatos populistas são alvo de
desconfiança até das próprias
pessoas que votam neles? O que
você acha disso? Em São Paulo,
por exemplo, os malufistas são
considerados também racistas.
Está tudo aqui neste livro (mostro
o livro: "O Malufismo", de Mauricio Puls, da série Folha Explica).
Pesquisas já mostraram que existem dois tipos de malufistas: os
pobres e sem escola, como teu marido, e os ricos racistas. Os malufistas ricos de São Paulo odeiam
nordestinos. Você sabia? Pois é,
teu marido vai votar contra você
mesma!"
Ela insinuou um argumento,
um "ele é burro mesmo", mas eu
não deixei, segui na verbiagem
solitária: "Populista é tudo gente
fora da lei. São sempre acusados
em casos horrorosos de desvio de
dinheiro público, enriquecimento
ilícito e outras sacanagens. Sabe
quantas vezes Maluf já perdeu
eleições? Candidatou-se dez vezes, perdeu sete. De alguma coisa
o povo sabe."
E concluí: "Quer saber, Lucinda, candidato populista só tem
tromba. Teu marido vota na
tromba. Vai morrer num fundo
de quintal em Diadema ou num
daqueles chiqueiros de porcos que
Maluf construiu na beira das
marginais fétidas, para meia dúzia de favelados viverem, e que
chamou de Cingapura. Obra de
fachada, para esconder o favelão
que continua lá atrás. Está aí,
cheia de irregularidades, caindo
aos pedaços."
Sugeri que ela continuasse estudando, do contrário, eu poderia
despedi-la. "Continuar no estudo
eu vou, porque quero e é bom pra
mim. Mas não tem estudo que
mude minha idéia. Político é tudo
uma cambada de gente safada.
Qualquer um."
E-mail - mfelinto@uol.com.br
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