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OPINIÃO
Uma política para moradores de rua
DENIZ FERREIRA RIBEIRO
Muito tem sido comentado sobre moradores de rua nos últimos
tempos. A sociedade começou a
notar que nas esquinas de cada
rua, debaixo dos viadutos e das
marquises, nas praças, nos canteiros dos jardins e nas vielas havia
pessoas -adultos ou crianças.
Essa presença, mais comum na
área central da cidade, onde escasseiam as residências, ganhou espaço nos meios de comunicação
proporcionalmente muito maior
do que sua real importância numérica. Afinal, são poucos milhares de pessoas entre os milhões
que vivem na metrópole. Hostilizados pela esmagadora maioria da
população, acabam se concentrando justamente nas regiões onde a maior parte evita morar.
Esse fenômeno não é novo, nem
paulistano, nem mesmo brasileiro. Ocorre nas grandes metrópoles
do mundo. São pessoas desajustadas dos padrões de comportamento adotados pela maioria da sociedade. Rejeitam, por motivos vários, o modelo de estruturação familiar usado universalmente pelos
seres humanos. Não lutam por
moradia nem almejam trabalho.
Têm como referência existencial
outros fatores, com os quais nem
sempre guardam coerência.
Trata-se de uma condição humana de difícil abordagem do
ponto de vista técnico, quando os
profissionais da assistência social
se empenham em desenvolver algum trabalho. Não obstante, embora baixos, os percentuais de recuperação alcançados incentivam
a continuidade dessas ações. Como na grande metrópole esses indivíduos podem viver em completo anonimato, nesse particular o
grande centro também exerce o
seu papel sedutor.
Para atualizar informações, a Secretaria Municipal da Família e do
Bem-Estar Social desenvolverá
neste ano um trabalho de pesquisa
e cadastramento dos moradores
de rua de São Paulo. No último
trabalho desse tipo, realizado há
dois anos, os dados revelavam
uma população de rua preponderantemente masculina, em plena
idade produtiva, de 19 a 44 anos,
dando conta ainda de que 60%
têm escolaridade precária (1º grau
incompleto). Com relação à procedência, 70% são oriundos de
Minas Gerais e do Nordeste.
Embora a maioria da população
seja hostil à própria existência dos
moradores de rua, a consciência
clara de que o poder público tem
responsabilidades fundamentais
no aprimoramento da democracia
levou a Prefeitura de São Paulo a
dedicar esforços crescentes ao
atendimento dessas pessoas, mormente nos últimos cinco anos.
Instalamos albergues, ampliamos as vagas, demos caráter permanente a esse atendimento
-não só no inverno, mas durante
o ano todo- e buscamos melhorias na qualidade dos serviços.
No inverno presente, por determinação do prefeito Celso Pitta, os
albergues municipais estão oferecendo vagas suficientes durante o
período da Operação Inverno, o
que tem tornado possível atender
à demanda. Neles há leitos individuais, com colchão e cobertor,
além de alimentação completa à
noite e pela manhã. Além disso,
estão disponíveis sanitários, banheiros e guarda-volumes.
O poder público municipal faz
sua parte na busca da construção
de uma sociedade mais equilibrada. Temos também a preocupação
de desenvolver um trabalho de
promoção social, com o objetivo
de reintegração desses indivíduos
a uma vida normal.
Lamentavelmente, os ventos que
sopram do Planalto Central só têm
trazido discursos como forma de
contribuição. A falta de ações concretas que criem mais postos de
trabalho e a prática de políticas
inibidoras da expansão da atividade econômica, que caracterizam a
fase posterior ao bem-sucedido
plano de estabilização da moeda,
têm contribuído negativamente
para alcançar aquele objetivo.
Embora não haja correlação direta e numericamente proporcional, é de esperar que a população
de rua tenda a se expandir com a
persistência da recessão econômica -e, inversamente, que tenda a
diminuir a partir do dia em que o
país voltar a crescer.
Deniz Ferreira Ribeiro, 57, é secretário municipal da Família e Bem-Estar Social de São Paulo
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