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Arredores de Bangu 1 vivem disputa
MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO
Pouco mais de uma hora depois que os primeiros clarões de luz surgiram no horizonte do Complexo Prisional de Bangu, ontem de manhã, a mulher de um preso
que chegava para o único dia semanal de visita cantarolou para
outras mulheres de presos: ""Bangu 1 quebrou no meio...".
Algumas a acompanharam. ""Vim com isso na cabeça desde casa", disse. ""É um pagode cantado pelo Bezerra da Silva."
Não quis revelar a identidade, como as amigas. Como quase todo mundo do lado de fora do conjunto de presídios e casas de custódia onde o prédio dito de segurança máxima, Bangu 1, estava rebelado desde a véspera.
No mesmo bar da cantoria, em frente ao portão do complexo,
uma mulher começou a gritar. Ela
temia que o levante liderado por
Fernandinho Beira-Mar impedisse o encontro com os detentos das
demais unidades carcerárias.
""Usam 200 homens para levar o
Fernandinho ao fórum. Com os
outros presos, vão só três guardas.
E param no caminho, levam para
o mato e batem neles. Quem botou dinamite [na verdade, um simulacro de granada" em Bangu 1?
Não fui eu, que com mais de 50
anos fico pelada para poder entrar." Abaixou-se, então, de cócoras, reproduzindo a posição que se diz obrigada a repetir nas revistas antes de entrar.
Urros e vaias
Em outra mesa, as mulheres dos
presos da casa de custódia Bangu
5 inscreviam seus nomes num papel à medida que chegavam. Elas
substituem, determinando a ordem das visitas, um trabalho que
deveria ser feito por guardas penitenciários.
Longe da mesa delas, perto da
televisão, dezenas de outras visitantes se dividiram em urros e
vaias de acordo com a imagem
que aparecia na tela: a de Beira-Mar ou a de outro traficante, Uê,
morto pelo líder da rebelião.
As mulheres também se repartem conforme a organização criminosa dos companheiros.
A maioria foi de ônibus. Muitas
com filhos. Não apareceu de manhã a que, na véspera, esteve em
frente ao complexo em um Mercedes Classe A. Seria, segundo a
polícia, mulher de um preso.
Na mesma tarde anterior, num
bar ao lado com duas máquinas
de videopôquer, parentes e amigos dos rebelados de Bangu 1 batiam palmas e comemoravam
quando alguém passava de carro
ou a pé e gritava: ""A ADA acabou!". A dez metros de distância,
policiais militares só observavam.
A mais de 1 km, em Bangu 1, tremulava a bandeira vermelha colocada pelos presos do Comando
Vermelho. O acesso aos jornalistas foi proibido desde a noite de
anteontem. Três odores se destacam diante do complexo: o do lixão próximo, de esgoto e dos milhares de frangos vivos que passam em caminhões -trata-se de
uma região ainda um pouco rural,
na zona oeste do Rio.
Advogado de Uê
No portão, dezenas de jornalistas, mais do que os amotinados de Bangu 1, esperaram notícias na longa jornada noite adentro. Às 20h36, um advogado (nem este quis dizer o nome) de Uê reclamou porque não pôde levar o corpo -só liberado ontem.
Às 22h47, saiu do complexo a advogada Valeriana Canuto, defensora de Celsinho da Vila Vintém, também preso de Bangu 1. "Celsinho está vivo, mas outras
famílias estão desesperadas. Não sabem quem morreu."
O agente penitenciário Paulo
Roberto Ferreira disse à 0h01, sobre os indícios de corrupção entre
seus colegas: ""Peguem um latão
com água cristalina. Se alguém
puser uma gota de querosene,
ninguém vai beber. Há quem seja
como querosene".
Em seguida, à 0h19, uma jovem
encapuzada que se apresentou
como sobrinha de um preso chamou os jornalistas para pedir que
as autoridades estaduais permitissem a entrada do pastor Marcos [religioso acostumado a negociar rebeliões em presídios" em
Bangu 1. Um travesti em sua companhia fez apelo igual.
Na madrugada, a temperatura
de menos de 20 graus Celsius fez
com que um PM usasse luvas de
lã. As luzes do complexo apagaram três vezes, deixando tudo na
escuridão.
Durante toda a madrugada e a manhã, a guarita destinada à observação privilegiada ficou vazia, sem um policial sequer.
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