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POLÍCIA
Representantes da promotoria dizem ter sido perseguidos por policiais após achar indícios de maus-tratos
Promotor apura tortura e é ameaçado
CARLOS HENRIQUE SANTIAGO
da Agência Folha, em Belo Horizonte
Três promotores
de Belo Horizonte
relatam e apuram
um caso que, se
confirmado, revela
a que ponto é capaz
de chegar o descontrole policial
em matéria de tortura.
Eles dizem ter descoberto uma
sala em que presos eram torturados dentro da DCP (Divisão de
Crimes contra o Patrimônio).
Sem que pudessem fazer o flagrante, foram retirados do local,
sob alegação de que havia uma rebelião -que, sustentam, foi estimulada pelos próprios policiais.
Na saída, encontraram seu carro oficial fechado por veículos da
polícia. Fugiram então a pé e foram perseguidos e xingados por
policiais civis de arma em punho.
"Fui chamada de piranha, de
prostituta", lembra a promotora
Inês Maria Dutra e Silva, que atua
na Vara de Execuções Penais como os dois outros colegas envolvidos. Segundo ela, o chefe do Departamento de Investigações de
Minas Gerais, delegado Otto Teixeira, ao qual a DCP está subordinada, chegou nesse momento, e
eles entraram no carro dele.
O veículo do Ministério Público
teve a pintura riscada com palavrões, os pneus rasgados e equipamentos furtados.
O atual titular da DCP, Marcelo
Machado, disse que condena a
atitude dos policiais contra os
promotores, mas nega que tenha
havido tortura e que a rebelião tenha sido provocada. Segundo ele,
o local é um "barril de pólvora,
pois as celas têm capacidade para
80 detentos, mas, no último dia
24, havia 378 presos".
Método conhecido
O caso começou no dia 24 de
setembro, quando o preso Marcelo Soares de Souza disse ter sofrido tortura na DCP e avisou que
outro detento passava pelo mesmo processo naquele dia.
A promotora Inês, o promotor
Octávio Augusto Martins Lopes e
outra colega se dirigiram à divisão. Em um cômodo, encontraram indícios de tortura: uma barra de ferro, um interruptor com
os fios descobertos, panos molhados e amarrados por um nó,
pneus velhos e um chuveiro.
Depois disso passaram a conversar com os presos. Foi então
anunciada a rebelião na carceragem, e os policiais disseram não
ter como garantir a vida dos promotores, que deixaram o local
sem levar as provas.
O preso Marcelo de Souza disse
que foi torturado pelo então delegado titular da DCP, Anderson
Bahia, pelo investigador José Maria "Cachimbinho" de Paula e por
mais dois policiais não identificados.
"Cachimbinho" é citado no
dossiê "Brasil Nunca Mais" como
autor de torturas durante o regime militar (1964-1985).
Em juízo, o preso político Ângelo Pezzuti da Silva, que morreu no
exílio, disse que foi torturado em
1969, no interior da Delegacia de
Furtos e Roubos -denominação
na época da Divisão de Crimes
contra o Patrimônio.
Pezzuti disse que foi torturado
no pau-de-arara, com choques
elétricos e "hidráulica", por "José
Maria da Delegacia de Furtos e
Roubos de Belo Horizonte" e outras pessoas.
No depoimento, ele disse "que a
hidráulica se processa da seguinte
forma: o indivíduo, de cabeça para baixo, tem introduzida na sua
narina e tamponada a boca de um
tubo pelo qual se destila a água" e
"que o processo leva ao afogamento ou à tortura".
Essa descrição confere com a
descrição da tortura na DCP que
um preso fez ao promotor Lopes:
a vítima é pendurada na barra de
ferro, sua boca é amordaçada
com o pano e ele é sufocado com
água no nariz. Os pneus serviriam
para evitar que o preso se machuque gravemente no caso de uma
queda do pau-de-arara.
A denúncia do Ministério Público foi apresentada na quinta-feira passada à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia
Legislativa de Minas Gerais, que
encaminhou o relatório dos promotores à Anistia Internacional.
A Procuradoria de Justiça nomeou comissão para apurar a suposta torturas de presos.
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