São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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SEGURANÇA

Segundo responsável pelo departamento, objetivo será melhorar o fluxo das informações que chegam às delegacias

Polícia Civil de SP agora ganha inteligência

ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Civil de São Paulo planeja ativar nos próximos 12 meses uma rede de inteligência no Estado, com núcleos regionais de captação de informações e de dados de ocorrências criminais.
Apesar da conotação negativa do termo "inteligência", reforçado pelos casos de tortura e abusos cometidos no regime militar, ele foi mantido na designação do novo setor que será o "cérebro" da corporação: Dipol (Departamento de Inteligência da Polícia Civil).
Segundo o delegado Massilon José Bernardes Filho, 53, diretor do órgão, o departamento auxiliará delegacias em investigações, no combate a quadrilhas e ao crime organizado, sem nenhum tipo de atuação política.
"Vamos organizar essa bagunça", diz ele, ao explicar que a principal função do Dipol será melhorar o fluxo das informações que chegam diariamente aos DPs.
O setor de inteligência da Polícia Civil, criado por decreto estadual (nš 47.166) no último dia 2, será o segundo em atividade em São Paulo. A Polícia Militar tem outra rede, formada por agências regionais espalhadas pelo Estado.
Especialistas ouvidos pela Folha destacaram a importância de se organizar as informações policiais para combater o crime organizado, mas mostraram-se preocupados com o fato de o país não ter encontrado ainda um modelo ideal para seguir e de não ter ocorrido um debate com a sociedade sobre as ferramentas de controle externo dessa atividade policial.
O próprio Plano Nacional de Segurança Pública, lançado em 2000 pelo governo federal, prevê a criação de um Subsistema Nacional de Inteligência de Segurança Pública ligando as polícias estaduais, mas não apresenta um formato a ser seguido pelos Estados.
Entre 97 e 99, quando do processo de criação da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o tema foi discutido no Congresso. Hoje, o órgão do governo federal está sujeito à fiscalização de uma comissão mista de deputados e senadores, mas, nem por isso, escapou de ter funcionários envolvidos em denúncias de grampos ilegais e espionagem política.
A equipe do Dipol ainda está em formação. Em dois meses, o delegado Bernardes Filho espera terminar um manual sobre inteligência policial para o Estado, um documento com regras de atuação e um código de disciplina.
A primeira fase de implantação do serviço de informações depende agora da liberação de R$ 8 milhões pelo governo federal, recursos do Fundo Nacional de Segurança, para a instalação de computadores em delegacias da Grande São Paulo, Campinas e Santos.
Com isso, será possível implantar o RDO (Registro Digital de Ocorrências), um novo modelo de boletim de ocorrência que irá alimentar o ""micrão" -computador central do Dipol, avaliado hoje em R$ 2 milhões, que fará cruzamentos de dados.
Para outra fase, a polícia tenta obter cerca de R$ 12 milhões para montar um banco estadual com fotos e vozes de criminosos, além de um cadastro de presos.
Paralelamente a esse trabalho, o Dipol começa a montar uma "rede capilar" de agentes -policiais de delegacias seccionais e especializadas que, após seleção interna, serão treinados para fazer análise, segundo métodos do departamento de inteligência, a fim de alimentar o sistema. Ainda não há estimativa de quantas pessoas participarão da rede.
A Polícia Civil de São Paulo conseguiu apoio da UnB (Universidade de Brasília) e da Unesp (Universidade Estadual Paulista) para realizar cursos de aperfeiçoamento. "Vamos ordenar a cabeça do policial, porque a informação tem de fluir rapidamente", afirma Bernardes Filho.
O Dipol também ficou encarregado de estruturar treinamento para os policiais, produzir projetos e cuidar da informatização da Polícia Civil, daí sua comparação com um "cérebro". O departamento dependerá das outras delegacias para ações de rua.
"Não vamos prender ninguém", afirma o delegado. Mas isso não impedirá a realização de operações externas para reunir informações para a rede.
Não haverá integração no dia-a-dia entre os serviços de inteligência da Polícia Civil e da PM. Mas, segundo o Dipol, haverá colaboração a partir de um núcleo de inteligência ligado ao secretário da Segurança Pública.
Nos bastidores da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo, as duas polícias travam uma batalha pela hegemonia nessa área de informações.
Existe uma polêmica decorrente do entendimento de delegados segundo o qual PMs não podem investigar, função que a Constituição diz ser específica da Polícia Civil. Essa foi a posição defendida por entidades ligadas à categoria após a Folha revelar, em julho, que um grupo de inteligência da PM usou presos irregularmente para se infiltrar em quadrilhas. Essa unidade (Gradi) é investigada hoje por homicídio, tortura e abuso de autoridade.
Em abril, essa disputa interna ganhou força, depois de a secretaria indicar apenas PMs para compor o Subsistema Nacional de Inteligência. A Polícia Civil agora tenta incluir representantes.


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