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ENSINO SUPERIOR
Segundo aluno, docente contava piadas sobre negros em universidade que aderiu ao sistema de cotas
Universitário acusa professor de racismo
HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
O professor de física Adriano
Manoel dos Santos, 31, virou réu
na Justiça de Mato Grosso do Sul
acusado de ser racista com o estudante de biologia Carlos Lopes
dos Santos, 35, que entrou neste
ano na Uems (universidade do
Estado) na cota para negros.
Lopes afirma que o professor
contava piadas sobre negros na
sala de aula. De acordo com o relato dele, no dia 23 de junho passado, Santos teria dito: "Tratava-se de um homem que, cansado
após um dia de trabalho, entrava
no ônibus e torcia para que quem
sentasse ao seu lado fosse uma loira, mas para seu azar era um negão que se sentaria".
Lopes registrou queixa contra
Santos na Polícia Civil. O inquérito foi enviado ao Ministério Público, que denunciou o professor
com base na lei 7.716/89, a qual
define crimes de "preconceito de
raça ou de cor". O artigo 20 da lei
em que Santos pode ser enquadrado prevê pena de um a três
anos de prisão mais multa.
No dia 12 de novembro passado, o juiz César Castilho Marques,
de Ivinhema (321 km de Campo
Grande), aceitou a denúncia.
O estudante disse que o professor também usava expressões como "um sujeito com muita melanina [proteína de cor preta encontrada na pele]" e "pretinho básico", além de afirmar que uma
universidade deve "nivelar por cima, e não por baixo" -no que seria uma referência à entrada de
negros na universidade.
No fim de novembro, houve novo desentendimento entre os
dois. Santos disse que chamou a
PM porque Lopes estava atrapalhando a aula e ofendendo sua
mulher. O caso virou processo no
Juizado Especial. Lopes prefere
não comentar o assunto.
O advogado Hédio Silva Jr., especialista em legislação de combate ao racismo no país e que atua
como assistente de acusação na
ação contra o professor, disse que
esse é o primeiro caso explícito no
Brasil envolvendo estudantes beneficiados pelo sistema de cotas.
Segundo Silva Jr., as cotas tendem a tornar "explícito" o racismo porque obrigam o contato entre negros e brancos.
"A cota não gera racismo, somente aflora o que tem dentro da
pessoa. Enquanto o negro estiver
correndo da polícia, no boteco bebendo pinga ou fazendo batuque,
ele está no lugar onde as pessoas
querem que ele fique", diz Lopes.
Na sexta-feira, Santos negou à
Folha que seja racista ou tenha
contado piadas do gênero. "O que
me deixa angustiado é que, nas
minhas raízes, o meu avô era negro e minha avó, por parte de pai,
era índia", afirmou Santos. "Eu
nunca tive nada contra as cotas.
Sou a favor de tudo o que diminua
as diferenças sociais", disse.
"Brincava [na sala de aula], mas
nunca mencionei nada de conteúdo racista", acrescentou. Segundo
ele, uma sindicância aberta pela
Uems para apurar o caso foi arquivada e julgada improcedente.
De acordo com Santos, cinco
alunos, sorteados para prestar depoimento na polícia, negaram
que ele seja racista.
"Nós já esperávamos que surgissem processos na questão de
racismo. A entrada de negros e índios na universidade fez com que
essa coisa aflorasse", afirmou a
pró-reitora de ensino da Uems,
Maria José Jesus Alves Cordeiro,
sobre a acusação feita pelo estudante. A pró-reitora disse que o
assunto está na Justiça e, portanto, diz ela, fora da universidade.
A Uems possui 7.000 estudantes
em 15 unidades no Estado. Para
negros, a universidade reserva
20% de suas vagas em cada vestibular. A instituição ainda guarda
10% (168 vagas) para índios.
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