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VIOLÊNCIA
Criminosos dão cestas básicas e remédios; ontem, alugaram ônibus para moradores irem a enterro de menina assassinada
Tráfico substitui Estado em favela de SP
ANTÔNIO GOIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Assim como acontece em alguns morros dominados por bandidos no Rio de Janeiro, os traficantes da favela Alba, no Jabaquara (zona sudoeste de São Paulo),
tentam conquistar a confiança
dos moradores suprindo necessidades que deveriam ser atendidas
pelo poder público.
Nesta favela, na noite de domingo, a menina Larissa Alves de
Souza, 5, morreu com um tiro durante uma operação do GOE
(Grupo de Operações Especiais),
da Polícia Civil.
Ontem, após o enterro de Larissa, os moradores continuavam a
culpar a polícia pela morte da menina e a isentar os traficantes do
local de qualquer culpa.
De acordo com moradores ouvidos pela Folha, os traficantes
compram cestas básicas e remédios e distribuem para as famílias
mais pobres. Ontem, por exemplo, dois ônibus que levaram moradores ao enterro foram pagos
pelos traficantes.
Os traficantes circulam normalmente, mesmo de dia, nos becos
da favela, e são cumprimentados
pelos moradores. Ontem, um deles, que se identificou com o nome fictício de Ricardo, acompanhou a reportagem da Folha durante quase uma hora.
Ele afirmou ter gasto R$ 280
com o enterro de Larissa, dinheiro que foi usado para alugar dois
ônibus e comprar uma coroa de
flores. A mãe de Larissa, Doraci
Alves de Souza, confirmou as informações dos traficantes.
Segundo Ricardo, até a quadra
de esporte e um parque infantil
foram construídos com o dinheiro do tráfico, após um roubo no
aeroporto de Congonhas em
1999, praticado por Chambau,
traficante que morava no local.
Na favela Alba, pelo menos segundo a versão dos moradores, a
lei do silêncio é imposta pela polícia, e não pelos traficantes. A dona-de-casa Maria Aparecida Santos, 59, por exemplo, afirma não
ter medo de falar dos traficantes
do local.
"Os policiais é que, quando entram aqui, dizem que a gente não
pode falar nada.Os traficantes já
me deram remédio quando eu
precisei e sempre respeitaram
muito a gente", diz Maria, que
mora há 22 anos no local e diz não
ter medo de aparecer. "Só vou
morrer no dia em que Jesus decidir", afirma.
Ela conta que esse grupo de traficantes substituiu outro: "Os outros botavam medo na gente, batiam em bêbado... Volta e meia a
gente encontrava alguém morto
por aqui. Desde que esses meninos (os novos traficantes) chegaram, o local ficou mais calmo".
Maria fez aniversário no domingo. A menina Larissa estava
em sua festa. Ela diz que seu sobrinho, Rafael Souza, já foi atingido
por tiros da polícia na favela.
Outra moradora, que não quis
se identificar, confirma as informações de Maria: "Não quero dar
entrevista com medo dos policiais. O pessoal daqui nos ajuda,
dá remédios. Por eles não tem
problema nenhum em falar. Vocês (da reportagem) podem entrar aí que não vai ter problema".
A fama dos traficantes do local
não é restrita à favela Alba. No
Centro de Saúde Estadual Dr.
Waldomiro Pregnolato, que fica
próximo à favela, a auxiliar de enfermagem Cristina Flaquer, 49,
afirma que os traficantes respeitam os médicos. "Eles não deixam
ninguém mexer com a gente e até
tomam a dor da gente quando alguém incomoda", diz a funcionária do posto.
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