São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NARCOTRÁFICO
Tripulantes que saem do porto de Santos embarcam até 50 kg de cocaína para a Europa, diz CPI
"Exportação" de droga é investigada

Flávio Florido/Folha Imagem
O deputado Torgan (esq.) acompanha o agenciador de 'mulas' Edésio Vieito na sessão da CPI


ALESSANDRO SILVA
SÍLVIA CORRÊA
SORAYA AGÉGE
da Reportagem Local

A CPI do Narcotráfico da Câmara dos Deputados confirmou ontem que parte da droga que entra no Brasil é escoada para a Europa a partir do porto de Santos, no litoral de São Paulo, embarcada possivelmente com colaboração de funcionários da Receita Federal.
Ontem, o vendedor de carros Edésio Queija Vieito confirmou aos parlamentares que agenciava "mulas" -pessoas que transportam a droga- para o traficante Jurandir Henrique de Assis, foragido e convocado para depor pelo comissão.
O porto é considerado pelos deputados como um braço da conexão Colômbia-Suriname, que passa também pelo Pará e está sendo investigada desde anteontem a partir do depoimento do mecânico J.R.P..
"Ele disse que colaboravam passageiros e funcionários do baixo escalão dos navios. Não citou donos de embarcações ou comandantes", disse o deputado federal Robson Tuma (PFL-SP).
"Segundo ele, cada tripulante do esquema embarcava com até 50 kg de droga", completou o deputado Moroni Torgan (PFL-CE), relator da comissão.
O depoimento do vendedor foi reservado. Ele tentou mentir, caiu em contradição e aceitou falar em separado depois de admitir que tinha medo de morrer.
Vieito foi descrito pelos deputados como um despachante do tráfico: contratava as "mulas", pagava e "exportava" a droga.
"É um esquema e que conta com a ajuda de fiscais da Receita Federal", disse o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).
De acordo com os deputados, diligências foram feitas em Santos na tarde de ontem pela Polícia Federal a partir de informações dadas por Vieito e pelo traficante que depôs logo após ele, também em sessão fechada (leia ao lado).
Os parlamentares não divulgaram os locais visitados nem os materiais apreendidos. Neles, porém, de acordo com Moroni Torgan, a CPI pôde constatar a omissão da Receita Federal.
"Há omissão na fiscalização, pois uns navios são mais fiscalizados que outros. Ainda não sabemos se a omissão é dolosa, conivente. O que posso dizer é que, coincidência ou não, os navios que são menos fiscalizados são exatamente os que carregam a droga", disse o deputado.
Em uma das remessas, de acordo com a CPI, os traficantes enviaram cerca de 200 kg de cocaína para a Espanha. Na Europa, a droga é vendida bem acima do preço cobrado na América Latina.
A CPI tem uma lista com datas de remessas, quantidade e destino, reunida pela PF, com a ajuda das polícias de outros países.
Segundo a CPI, o porto envia drogas e recebe armas da Europa, que acabam redistribuídas dentro do país ou pagam a cocaína. As drogas viriam da Colômbia. O Suriname seria outro fornecedor de armamentos (leia texto ao lado).
"O dinheiro das armas alimenta o tráfico, que depois incrementa todo o esquema", disse Torgan, ao explicar o financiamento do crime organizado. As armas são trocadas por drogas e vice-versa.
O caminho Colômbia-Suriname chegou a ser batizado de conexão Filipinas, em razão da nacionalidade das pessoas que seriam usadas no esquema de transporte.
Às 19h de ontem, a CPI começou a ouvir o superintendente da Receita Federal em São Paulo, Flávio Del Comuni, sobre o rota de exportação descoberta no porto de Santos e as falhas de fiscalização do órgão que comanda.
Del Comuni está sendo investigado pela PF por envolvimento em esquema de fraudes, favorecimento ao contrabando e arrecadação de propinas para financiamento de campanhas políticas. A investigação segue em segredo. Já foi pedida a quebra de sigilo fiscal, telefônico e bancário dele.
O inquérito nº 2-1012/99 foi aberto em junho do ano passado com base em um dossiê recebido pelo Ministério Público Federal.
Os deputados afirmam contar com lista de possíveis chefes do esquema em Santos, entre os quais figuraria o nome do superintendente. A CPI pretende rastrear a vida financeira dos citados, mas não vai revelar seus nomes.
O porto de Santos é o segundo investigado pela comissão. O primeiro foi o de Paranaguá (PR). O esquema no Paraná, porém, é diferente, segundo a comissão. As armas chegam de Miami (EUA), desembarcam em contêineres e são despachados em caminhões para o Paraguai. Depois, é que o armamento volta, trocado com traficantes brasileiros por drogas.


Texto Anterior: Barbara Gancia: Vira-lata une os moradores do Itaim
Próximo Texto: Conexão envolve 4 cidades do Brasil
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.