São Paulo, domingo, 14 de abril de 2002

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SAÚDE

Campanha combate uso abusivo da voz

AURELIANO BIANCARELLI
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

"Olha a maçã! Vai levar freguesa?" O feirante José Fernando Lombardo, 39, vive do grito desde os nove anos de idade, quando começou a trabalhar em feiras livres em São Paulo.
Lombardo, conhecido como "Papagaio" entre os colegas por falar muito, tem a voz rouca há muitos anos por causa do esforço diário. "A propaganda faz parte do negócio. Não posso parar."
A voz é um instrumento de trabalho para milhões -estima-se que 40% da população ativa a utilize na atividade profissional.
A Sociedade Brasileira de Laringologia e Voz criou, com o apoio de outras entidades, uma campanha para alertar todos esses profissionais no próximo dia 16, Dia Nacional da Voz. São professores, feirantes, operadores de telemarketing, advogados e, claro, cantores, alguns dos que mais correm riscos de ter problemas vocais por causa do uso excessivo que fazem desse instrumento.
As pregas vocais (o termo cordas vocais é incorreto) são o principal componente do aparato que produz a voz. Quem fala muito, ri alto, grita e força a voz em excesso pode danificar as pregas.
O fumo agrava o quadro por irritar as mucosas dessas estruturas. O estresse é ruim porque tenciona a musculatura da laringe. Mudanças bruscas de temperatura também são prejudiciais, assim como o álcool.
O abuso da voz pode causar nódulos ("calos") a longo prazo, o problema mais comum. Inflamações e úlceras também podem acometer as pregas em razão do mau uso da voz.
Qualquer alteração por mais de duas semanas, como rouquidão, é motivo para visita ao otorrinolaringologista. Quando o médico detecta um problema, o fonoaudiólogo auxilia no tratamento.
"A maioria dos casos é resolvida com reeducação da voz por meio de exercícios prescritos e orientados pelo fonoaudiólogo", diz o presidente da Sociedade Brasileira de Laringologia e Voz, José Antonio Pinto.
Estima-se nos EUA que 7,5 milhões de pessoas tenham dificuldade para usar a voz. No Brasil, o estudo mais citado por especialistas foi realizado no ano passado por fonoaudiólogos com 422 professores da rede pública municipal de São Paulo -60% apresentavam alterações na voz.
Calcula-se que os prejuízos com afastamentos do trabalho e readaptações por problemas de voz cheguem a R$ 100 milhões anuais.
"As disfonias [alterações de voz] ainda não são reconhecidas como doenças decorrentes do trabalho", diz a presidente da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, Leslie Biccolotto Ferreira. Segundo ela, não há parâmetros para avaliar casos de alterações na voz de profissionais que a utilizam como instrumento de trabalho. Otorrinos, fonos e médicos do trabalho estarão reunidos entre os dias 10 e 11 de maio no Rio para a elaboração de um consenso de voz profissional. Uma das intenções é justamente o reconhecimento das disfonias como doenças do trabalho.



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