|
Próximo Texto | Índice
REFAVELA
Moradias, bares, garagens e até igreja evangélica são improvisados dentro dos condomínios criados nas gestões Maluf e Pitta
Barracos e puxadinhos invadem Cingapuras
VICTOR RAMOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A favela pulou o muro e invadiu
conjuntos habitacionais do projeto Cingapura, criados pela Prefeitura de São Paulo para substituir
barracos por prédios. Moradias,
garagens e até uma igreja estão
sendo improvisadas com madeira, chapas de aço e telhas na área
interna dos condomínios.
A Folha percorreu nos últimos
dias sete unidades do projeto,
criado nas administrações Paulo
Maluf (1993-1996) e Celso Pitta
(1997-2000). Em todas elas, o cenário se repetiu. Nas áreas públicas dos condomínios, barracos se
amontoam, disputando espaços.
O processo de favelização dos
conjuntos habitacionais, segundo
especialistas, é provocado pelas
falhas no projeto dos condomínios e pela ausência do poder público (leia texto na pág. C3).
O Cingapura foi uma das principais bandeiras das gestões Maluf e
Pitta. O projeto visava a verticalização e a urbanização de favelas,
criando áreas de convivência.
O que pode ser verificado, no
entanto, é que essas áreas estão
sendo ocupadas por novos barracos, que são construídos imediatamente ao lado dos prédios.
Em um Cingapura no bairro do
Butantã (zona oeste) já são pelo
menos 15 destinados a moradia
na área do condomínio. Rosana
de Paula Batista, 32, disse ter gasto
R$ 2.600 em materiais de construção, principalmente madeira, para fazer sua nova casa próxima à
da sua mãe, que vive em um dos
apartamentos regulares.
"O meu aluguel estava três meses atrasado. Como minha mãe
mora aqui, fiz meu barraco em
frente", afirmou Batista. Ela disse
que, junto com seus vizinhos, fez
ligações de encanamento com a
rede de esgoto do condomínio.
"Esse lugar estava abandonado,
criando rato. Acho até bom que
tenha gente morando", afirmou
Carlos Claudino de Melo, 45, síndico de um dos prédios do conjunto, ao comentar a instalação
dos barracos.
Dentro do Cingapura Jaguaré
(zona oeste), a situação não é
muito diferente. São garagens,
uma quitanda e uma vendinha de
doces, que pertence a Tereza Maria de Jesus, 53. "Eu tinha um comércio na favela, que perdi quando ganhei o apartamento. Arrumei madeira e fiz minha loja
aqui", relatou.
Adão Barbosa, líder comunitário do Cingapura Zaki Narchi (zona norte), tem opinião diferente
sobre os barracos. Onde mora, os
"puxadinhos" com garagens improvisadas, que vão de ponta a
ponta no condomínio, são vistos
da rua. "A gente sabe que é garagem, mas quem passa lá fora pensa que é favela."
Há diversos exemplos nos outros conjuntos visitados. Em um
deles, na Casa Verde (zona norte),
existe um barraco que virou sede
de uma igreja evangélica, depois
de ser usado como depósito por
alguns anos. A moradora Cleudina Menezes, 56, conta que os cultos acontecem pelo menos cinco
vezes por semana no local.
São comuns, também, os pequenos bares adaptados. "É onde
a gente se diverte aqui perto", disse Claudio Antonio, morador de
um apartamento, que diz que a
lista de utilidades dos barracos "é
grande". "Tem até barbearia."
Próximo Texto: Refavela: Para especialistas, poder público é ausente Índice
|