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ANÁLISE
Causa é desconhecida; efeito é notório
RICARDO BONALUME NETO
enviado especial ao Rio
Ninguém sabe com certeza o
que causa o fenômeno climático
conhecido como El Niño, manifestado principalmente pelo
aquecimento da água ao longo
da costa oeste sul-americana.
Ele surge de uma complexa interação da atmosfera e dos oceanos, mediados pelo calor solar.
Mas se a causa é debatida, os
seus efeitos em todo o mundo
são conhecidos, assim como o
tamanho do fenômeno. Este
mês a água do mar que banha o
Peru está em média 5º C acima
da média.
Fazer isso equivale a uma
quantidade de energia difícil de
acreditar ou de imaginar. Pesquisadores do Cptec (Centro de
Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos) do Inpe (Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais) fizeram um cálculo para
ter uma idéia da dimensão do
aquecimento.
Eles calcularam quanto custaria mudar em apenas 1º C a temperatura de uma "fatia" do
mar, um paralelepípedo de
5.000 km de extensão e 1.500 km
de largura por apenas 100 m de
profundidade.
Segundo Gilvan Sampaio de
Oliveira, coordenador da Divisão Operacional de Clima do
Cptec, a energia gerada seria
equivalente a mil vezes o que a
usina hidrelétrica de Itaipu produz por ano.
A energia se mede em joules.
Essa mudança de temperatura
no mar equivale a 10 elevado à
vigésima potência joules, isto é,
10 seguido de 20 zeros. Itaipu
produz na ordem de "meros" 10
elevado à 17 (10 seguido de 17 zeros) joules de energia por ano,
diz Gilvan.
Para fazer cálculos sobre o
comportamento do clima nos
próximos meses os cientistas
precisam ter uma boa máquina
de calcular (um supercomputador), um modelo matemático
que misture bem os ventos com
as correntes marinhas com a luz
solar e o papel das nuvens, e dados, muitos dados.
Supercomputadores são as
máquinas mais poderosas que
existem, capazes de fazer cálculos em velocidades muito altas,
da ordem de um bilhão de operações por segundo. O desempenho individual tem aumentado
muito -em cinco anos, a capacidade dessas máquinas aumentou em cerca de dez vezes.
Mas a previsão de tempo exige
bem mais. Ela começa com a coleta de dados básicos em uma escala global: temperatura, ventos, pressão e umidade.
As fontes são as mais variadas,
desde bóias marítimas, balões
de sondagem ou plataformas de
coletas de dados e satélites artificiais. No Pacífico, essas fontes
são mais precisas que no Atlântico Sul -por isso um projeto
internacional envolvendo instituições de pesquisa de Brasil
(notadamente USP e Inpe),
França e EUA, conhecido pela
sigla "Pirata", vai instalar sensores no mar entre o Nordeste e
a África.
Os dados obtidos são checados
e, já depurados de erros, são levados ao supercomputador. Um
modelo numérico utilizando
equações complexas faz o relacionamento dos dados entre si,
para prever como o sistema se
comportará no futuro. Os cálculos obtidos são transformados,
por exemplo, em imagens.
Demorou para o Brasil ter supercomputadores porque esse
tipo de máquina também é importante para a fabricação precisa de armamento nuclear. Os
EUA, principalmente, tentam
policiar o resto do planeta para
evitar a "proliferação" de armas
e de seus vetores, como mísseis
balísticos. Para comprar o próximo supercomputador não se
prevê nenhum problema político desse tipo.
"Ninguém mais perde fim de
semana lá no Inpe", brinca Gilvan. É possível fazer previsões
mais do que razoáveis sobre o
tempo dos próximos dias. Mas
quando se fala de meses, um dos
poucos casos de previsões bem
sucedidas tem sido aquelas referentes ao El Niño.
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