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Duração e falta de continuidade são consideradas falhas
DA SUCURSAL DO RIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Apesar de ter o mérito de trazer
o problema do analfabetismo para a discussão nacional, o programa Brasil Alfabetizado não passa
de uma campanha para mostrar
números à sociedade.
Além disso, o pagamento por
cabeça e a exigência de 90% de
frequência por parte dos alunos
mercantiliza e pode prejudicar o
processo de aprendizagem em regiões onde quem precisa aprender a ler e escrever também precisa se ausentar da sala de aula por
muitos dias para trabalhar.
A opinião é da superintendente-executiva e coordenadora nacional da Alfabetização Solidária, Regina Esteves, e da pró-reitora da
Universidade Estadual da Paraíba, que mantém parceria com a
ONG, Eliane Moura da Silva.
"Vai haver uma caça por analfabetos", diz Silva. "Nenhum alfabetizador vai querer perder dinheiro, por isso, se o aluno precisar ficar um mês fora do curso, vai
ser substituído", defende Esteves.
Entre os outros pontos do projeto que são criticados estão a descentralização da sua execução,
sem o suporte de uma proposta
clara do que o governo entende
por alfabetização; a formação
apressada de alfabetizadores; a
precariedade da avaliação dos resultados dos cursos; e a falta de
preocupação com o posterior encaminhamento dos recém-alfabetizados ao sistema público de ensino, para continuar a estudar.
"Defendemos a diversidade de
metodologia, mas é preciso seguir
uma mesma concepção do que é
alfabetizar. Isso não está claro no
governo", diz Esteves. "É uma
campanha de massa [o Brasil Alfabetizado]. Se diferencia de um
projeto porque é efêmera, assistemática e quantitativa. Está fadada
ao fracasso", afirma Silva.
"Não concordo que não exista
uma orientação pedagógica do
programa", afirma Maria Alice de
Paula Santos, coordenadora do
Movimento de Educação de Jovens e Adultos do Instituto Paulo
Freire. Segundo ela, no material
enviado pelo MEC aos conveniados, há indicação dos princípios
norteadores do projeto: a sociolinguística, a psicolinguística e o
diálogo. "Não está explícito, mas
está lá", completa Santos.
Continuidade
Ela concorda, porém, que a proposta do governo deveria prever a
continuidade do aprendizado.
"Apesar de representantes do ministério defenderem publicamente a idéia, ela não está escrita em
nenhum documento do projeto."
A pesquisadora em educação
Dolores Kappel tem opinião semelhante. Para ela, a idéia de erradicar o analfabetismo é nobre,
mas é preciso garantir que o alfabetizado não esqueça o que
aprendeu no curso.
"Ser alfabetizado é o direito número um do cidadão brasileiro. O
que me preocupa é saber como o
governo vai atingir toda essa
clientela e garantir que, no futuro,
eles não voltem a ser analfabetos."
Ela afirma que será preciso dar
continuidade aos estudos dos recém-alfabetizados. "As pessoas
podem aprender e desaprender.
No sentido mais rústico, o analfabetismo já foi resolvido em vários
países. O que se discute hoje é o
conceito de alfabetização mais
amplo, quando a pessoa consegue
completar ao menos a quarta série do ensino fundamental."
Duração e qualidade
Outra crítica é a duração dos
cursos. "É impossível para alunos
que nunca tiveram contato com
as letras se alfabetizar em seis meses", diz Santos. A ex-deputada
federal pelo PT, Esther Grossi,
coordenadora de pesquisa do
Geempa (Grupo de Estudos Sobre Educação, Metodologia de
Pesquisa e Ação, um dos conveniados do MEC), não concorda.
"O mais importante é a qualidade do ensino. É preciso saber qual
a teoria que vai ser aplicada. As
pessoas acham que é preciso muito tempo, mas o método do
Geempa já comprovou que é possível alfabetizar em três meses."
Elvira Souza Lima, consultora
de secretarias da Educação, diz
que o principal gargalo de programas de alfabetização no país é a
formação dos educadores. "Parte
do princípio que quem é alfabetizado sabe alfabetizar. E sabemos
que não é assim", afirma.
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