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São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2003

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PATRIMÔNIO

Construção de usina, na divisa entre SP e MG, revelou que quatro culturas viveram na região; museu reúne 12 mil peças

Água preservou acervo de 9.000 anos

SÍLVIA FREIRE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM OUROESTE

A cor da água do rio Grande, na divisa dos Estados de São Paulo e Minas Gerais, deu origem ao nome do Museu Arqueológico Água Vermelha, inaugurado no dia 2 de setembro, em Ouroeste, um município de 7.500 habitantes, localizado a 591 km a noroeste de São Paulo. Das margens do mesmo rio saíram 12 mil peças arqueológicas que compõem atualmente seu acervo.
Os objetos mais antigos são de pedra lascada e foram feitos há 9.000 anos. Apenas para efeito de comparação, a rainha egípcia Nefertiti, cuja suposta múmia teria sido identificada recentemente, viveu há 3.300 anos.
O primeiro sítio arqueológico na região foi descoberto por um pescador e seu filho, em 1997. A queda de uma árvore na margem do rio -possivelmente causada pelo aumento da vazão do rio com a abertura do vertedouro da usina Água Vermelha- fez aflorar uma ossada humana fossilizada de cerca de 500 anos, que fazia parte de um cemitério.
"Meu filho gritou: "Pai, vem ver uns ossos de carneiro que eu encontrei". Vi parte de um crânio e achei que fosse de índio. Avisei o delegado, mas nem ele sabia do que se tratava", disse o pescador Antônio Carlos Leandro, conhecido como Brejinho.
A descoberta acabou chegando aos técnicos do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que fizeram pesquisas no local e identificaram a importância da descoberta. Os objetos encontrados indicam que quatro culturas viveram na região em diferentes épocas.
Daí até a inauguração do museu foram anos de discussões mediadas pelo Ministério Público Federal. A Procuradoria entendeu que a proprietária da usina, na época a Cesp-Tietê, deveria compensar a sociedade pelo dano causado ao patrimônio cultural.
"Muito material foi levado pela enxurrada quando eram abertas as comportas da usina. Não há como recuperar isso", disse o arqueólogo Paulo De Blasis, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo e um dos pesquisadores do material.
Em 2001, já com a usina comprada pela AES-Tietê, foi assinado um termo de ajustamento de conduta -documento com peso de decisão judicial- no qual a empresa se comprometia a construir e instalar o museu, além de adotar ações para preservar os sítios. À Prefeitura de Ouroeste coube ceder o terreno e assumir sua manutenção e o funcionamento do museu. Segundo o prefeito Edvaldo Fraga da Silva (PFL), será gasto anualmente R$ 100 mil, equivalente a 1% da receita do município.
"O Ministério Público Federal tem margem para decidir o que fazer para compensar os danos. O museu foi a opção mais adequada e viável. Quer melhor maneira de compensar a perda de patrimônio cultural do que produzir cultura para a região?", indaga a procuradora Maria Luiza Grabner, que mediou a discussão.
Segundo o diretor de operações da AES-Tietê, Ruan Carlos Castagnino, a empresa investiu R$ 1 milhão no museu. "Não estivemos contra [a reparação do dano]. Somos uma empresa responsável, apenas quisemos medir o impacto [que foi apresentado]."
Já foram identificados 24 sítios arqueológicos, mas apenas três foram explorados. A pesquisa arqueológica mostrou que a proximidade com a água vermelha foi um fator de conservação.


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