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TRANSPORTE
Zarattini desmente explicação anterior e usa brecha em decreto para bancar salários de motoristas de ônibus
Secretário repassou R$ 1 milhão a viações
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
O secretário dos Transportes de
São Paulo, Carlos Zarattini, voltou atrás ontem em sua justificativa para a transferência de R$ 665
mil às contas de duas empresas de
ônibus em agosto deste ano. Ele
afirmou ter cometido um erro em
sua explicação anterior, divulgada
em nota oficial à imprensa, e admitiu ter repassado R$ 1,044 milhão -e não R$ 665 mil- para
quatro viações -e não duas-
com a intenção de pagar os salários de motoristas e cobradores.
Zarattini utilizou um novo argumento para justificar a suposta
legalidade da operação: uma brecha no decreto nš 42.184, publicado por Marta Suplicy em julho
deste ano, permitiria à prefeitura
socorrer as empresas em dificuldades -desde que, para tanto, a
SPTrans (São Paulo Transporte,
órgão municipal que cuida do setor) utilizasse a verba acumulada
com multas e retenções.
O decreto citado por Zarattini
afirma que a receita descontada
das empresas de ônibus por irregularidades na prestação do serviço seria revertida para investimentos no sistema de transporte,
como a requalificação dos trabalhadores, a modernização tecnológica, a implantação de catracas
eletrônicas, a construção de terminais, as melhorias das vias e a
aquisição de veículos à frota.
Um parágrafo do texto faz um
adendo: "Os saldos financeiros da
conta [...] poderão ser utilizados
na gestão financeira do sistema de
transporte, desde que tal não
comprometa os investimentos
previstos neste decreto". Esse trecho foi a base usada pela prefeitura para a transferência de R$ 1,044
milhão -embora os demais investimentos citados no decreto
não tenham sido concretizados.
A denúncia de que Zarattini teria repassado dinheiro de forma
irregular às viações partiu de William Ali Chaim, militante ligado
ao alto escalão do PT e presidente
do grupo de ônibus Romero Niquini, que teve os contratos rompidos pela SPTrans em setembro
por irregularidades na prestação
de contas da arrecadação.
Segundo Chaim, foram depositados R$ 265 mil na conta da viação Santa Bárbara, de Niquini, e
R$ 400 mil na da Cidade Tiradentes, de Leonardo Capuano, para
pagar os salários nas viações Santo Amaro e Ibirapuera, controladas por Capuano, mas que Niquini pretendia comprar. A transferência dos R$ 665 mil facilitaria a
compra pretendida por Niquini.
Em sua primeira explicação para justificar a operação, comprovada por extratos bancários, Zarattini alegava que a verba se referia às multas aplicadas e devolvidas porque havia recursos para
anulá-las. A Folha mostrou ontem que esse procedimento era irregular, já que as normas da
SPTrans indicavam que a devolução do dinheiro das multas só pode acontecer depois do julgamento do recurso. "A nota realmente
tinha um erro", afirmou Zarattini.
O comunicado divulgado na última segunda-feira também informava que os R$ 665 mil já tinham retornado aos cofres da
prefeitura. Ontem, Zarattini corrigiu a informação. "Só uma parte
já voltou. Não sei dizer quanto."
Critério
O R$ 1,044 milhão transferido às
empresas de ônibus no dia 13 de
agosto, segundo Zarattini, havia
entrado na conta da SPTrans no
dia 8, quando as viações sofreram
desconto pela não-renovação da
frota, conforme previsto em contrato. Ele disse que a verba foi repassada às viações Santo Amaro,
Ibirapuera, Cidade Tiradentes e
Santa Bárbara.
"O repasse teve como critério as
empresas que estavam com dificuldade de pagar salário", afirmou Zarattini. A Santo Amaro e a
Ibirapuera, do empresário Capuano, estavam paradas havia
quase uma semana. O secretário
deixou dúvidas, porém, sobre a
ajuda à Cidade Tiradentes e principalmente à Santa Bárbara, de
Niquini, que não estava em greve
e cujos trabalhadores, segundo a
empresa, já haviam sido pagos.
"Ela [Santa Bárbara] estava com
dificuldades e iria parar depois.
Não foi dinheiro para ninguém
comprar empresa de ninguém",
disse Zarattini. Chaim, que comandava a viação na época, nega
a versão. "Eu repassei os R$ 265
mil ao Leonardo [Capuano]. Você acha que, se estivesse com problemas na Santa Bárbara, daria
esse dinheiro para outro grupo?",
questiona Chaim, para quem a
transação foi feita para facilitar a
compra das viações Santo Amaro
e Ibirapuera pelo grupo Niquini.
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