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LETRAS JURÍDICAS
O problema do menor é cada vez maior
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
A União, o Distrito Federal e os Estados podem expedir leis a respeito de medidas
que resguardem o ser humano
desde o nascimento. A proteção
efetiva dispensada à infância e à
juventude é prevista desde o atendimento em creche até o direito à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária da
criança e do adolescente, além de
colocá-las a salvo de toda forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
É muito provável que o leitor
não relacionado com a profissão
jurídica esteja pensando que descambei para o reino da fantasia,
ao alinhar tantos direitos da
criança e do jovem. Pois saiba que
o parágrafo anterior foi extraído
quase por inteiro da Constituição.
Define deveres da família, da sociedade e do poder público para a
realização dos objetivos indicados. Confira nos artigos 24 (inciso
XV), 208 (inciso IV) e 227, impondo o dever de assegurar o cumprimento dessas normas da Carta
Magna.
Além de disposições constitucionais, há leis ordinárias acrescentando outros dispositivos, destinados ao mesmo fim. O quadro é
ruim na prática, mas seria injusto
não reconhecer que, apesar do
crescimento populacional e da
concentração urbana, tem havido
progresso. Insuficiente, mas progresso.
Problema sério é o de saber se a
Febem -cujos defeitos gritantes,
de notícia recentíssima vinda de
Franco da Rocha (SP), com denúncias de violência contra os internos- deve ser mantida ou se,
tendo fracassado na defesa do
bem-estar do menor (é o dever definido em seu nome), melhor será
substituí-la por outras instituições, com pessoal habilitado a
preservar os valores constitucionais e legais indicados.
O Supremo Tribunal Federal
(STF), ao julgar o habeas corpus
nº 81.519, sendo relator o ministro
Celso de Mello, reconheceu que o
Estado enfrenta dificuldades intransponíveis. O pedido foi formulado em nome de menor mantido na cadeia pública de sua cidade, e não no regime semi-aberto, previsto em lei, no qual pudesse ser submetido a tratamento social e educacional de recuperação. O menor praticou homicídio
qualificado, ou seja, matou a vítima com uma das agravantes indicadas no parágrafo 2º do artigo
121 do Código Penal. Se fosse
maior, o crime resultaria em até
30 anos de prisão. O habeas corpus foi indeferido, mantendo-se o
menor na cadeia local, destinada
aos maiores de idade.
Como isso foi possível? Simples:
na cidade não havia estabelecimento apto para o cumprimento
da lei. Por outro lado, a semiliberdade pretendida pela defesa envolvia riscos em face das condições em que o delito havia sido
cometido. Não tenho informação
a respeito, mas é provável que o
regime de semiliberdade fosse perigoso para a sobrevivência do
menor. A segunda turma do Supremo Tribunal Federal admitiu
que ele continuasse retido na cadeia pública, mesmo isolado, sem
a companhia de adultos. Nesse
caso e em virtude da situação especial encontrada na localidade,
o STF concluiu pela legalidade da
solução.
A impossibilidade material vivida pelo poder público inviabilizou outro caminho para o caso,
que, contudo, se repete em muitas
cidades, numa falha coletiva contra os preceitos constitucionais referidos de início. Por essa e por
outras, o problema do menor tende a ser cada vez maior.
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