São Paulo, quarta, 15 de abril de 1998

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DENGUE
Ex-ministro diz que texto de 95 já alertava para uma explosão da doença; FHC participou de reunião em 96
Governo sabia da epidemia, afirma Jatene

AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

O governo sabia que o surto de dengue explodiria se medidas de erradicação do mosquito Aedes aegypti não fossem adotadas. A afirmação foi feita pelo cirurgião e ex-ministro da Saúde Adib Jatene.
Para ele, a dengue era uma epidemia anunciada e poderia ser evitada. Seu combate era uma prioridade de governo de Fernando Henrique Cardoso.
Jatene estava à frente do ministério quando foi elaborado o Plano Diretor de Erradicação do Aedes aegypti (PEA), em dezembro de 1995 e início de 1996. "No texto de introdução do plano, já estava previsto que a epidemia aconteceria se nada fosse feito", afirma.
O plano foi debatido e aprovado em março do ano seguinte em reunião ministerial presidida pelo presidente da República. A médica sanitarista Fabíola Aguiar Nunes, que estava à frente do programa e do Conselho Nacional de Saúde, disse que o presidente participou das discussões com os ministros e que saiu informado da gravidade da situação. "Aprovou-se um plano interministerial e Jatene passou a presidi-lo", disse Fabíola.
Segundo a médica, FHC teria dedicado um dos programas da Radiobrás, de meados de 96, à epidemia da dengue. "O presidente prometeu que acabaria com a doença até o final de seu mandato e que deixaria em andamento o plano de erradicação do mosquito."
Adib Jatene deixou o governo em novembro de 1996 por não concordar com a redução das verbas destinadas ao ministério. "Em março de 1997 seria lançada a campanha para começar a erradicação em todo o país", afirmou o ex-ministro. "Mas, com o esquema financeiro previsto para 1997, o plano estava inviabilizado."
Jatene disse acreditar que, apesar do atraso, o surto da dengue estará sob controle. "O ministro José Serra certamente conseguirá mobilizar os recursos necessários e a doença será controlada. Mas é certo que a epidemia poderia ter sido evitada." O ex-ministro disse não ter condições de estimar quanto o país gastará com as vítimas da doença.
Em dezembro de 1995, quando o plano começou a ser montado, tinham sido registrados 127,3 mil casos da doença. Em dezembro do ano passado, eram 254,1 mil.
O ex-ministro lembrou que a dengue estava entre as três preocupações que o levaram a pedir a criação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). As outras eram a mortalidade infantil e a malária.
Carlos Albuquerque, que substituiu Jatene, cortou pela metade os recursos destinados ao combate à dengue e reduziu o plano de erradicação -que estava subordinado diretamente ao ministro- a um simples programa dentro da Fundação Nacional da Saúde.
A decisão de se erradicar o Aedes aegypti foi tomada no final de 95 numa reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS), órgão que deve nortear as políticas de saúde.
"Estava claro que a dengue não era um problema apenas da Saúde, mas de vários outros ministérios", afirma Fabíola Nunes. "Era preciso uma decisão política e ações sincronizadas em todos os Estados, além de uma estratégia continental."
O custo de todo o plano, incluindo obras de saneamento, estava estimado em R$ 4,5 bilhões.
O plano elaborado a partir de então foi considerado exemplar pela própria Opas (Organização Panamericana da Saúde). Graças às intervenções do Brasil, a estratégia de erradicação foi adotada em toda a América Latina. "Nós conseguimos o que parecia impossível, mas paramos no meio do caminho", disse Fabíola. "O Brasil precisa retomar seu programa e seu papel no continente."



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