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EDUCAÇÃO
Escolas alegam que alunos mais velhos e os formados pelo ensino médio público precisam de reforço para seguir cursos
Universidade tenta suprir formação falha
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
A má qualidade do ensino médio público brasileiro e a presença
de um número cada vez maior de
adultos que voltam a freqüentar o
ensino superior depois de muito
tempo longe da sala de aula têm
levado universidades a criar cursos paralelos que podem funcionar, na prática, como espécie de
aula de recuperação de conteúdos
esquecidos ou não aprendidos.
Como a LDB (Lei de Diretrizes e
Bases da Educação), de 1996, permitiu que as instituições fizessem
processos de seleção menos rígidos do que o vestibular, as universidades começaram a receber alunos com mais dificuldade para
acompanhar as aulas de um curso
de graduação.
Essa mudança no perfil do estudante de graduação é confirmada
por duas estatísticas. A comparação do Censo do IBGE de 1991
com o de 2000 mostra que, nos
anos 90, os universitários com
mais de 30 anos foram o grupo
que mais cresceu em comparação
com os alunos de outras idades no
ensino superior. Nesses nove
anos, eles passaram de 232 mil para 638 mil, um aumento de 175%.
No mesmo período, o crescimento do total de alunos do ensino superior de todas as faixas etárias foi de 108%. Com isso, os universitários com mais de 30 anos,
que representavam 17% do total
em 1991, passaram a responder
por 22%, o maior incremento entre todas as faixas etárias.
Além da presença maior dos
mais velhos, os dados do questionário socioeconômico do Provão
(o Exame Nacional de Cursos)
mostram também que, nos últimos cinco anos, aumentou a participação de estudantes da escola
pública entre os formandos.
Comparando os dez cursos avaliados desde 1998 no exame, os estudantes que estudaram a maior
parte ou todo o ensino médio em
escolas públicas passaram a ser
maioria em 2003, representando
50,2% dos formandos. Em 1998,
eles eram 45,4% do total.
Nesses últimos cinco anos, os
estudantes da rede média pública
passaram a ser mais representativos do que os da rede privada, que
diminuíram sua participação no
total de estudantes de 49,4% para
45% no mesmo período.
O reforço
Foi para atender a esses dois públicos (mais velhos e oriundos da
rede pública) que o centro universitário UniCarioca, do Rio de Janeiro, criou no ano passado cursos on-line gratuitos de português
e matemática para ajudar estudantes com dificuldades nessas
duas disciplinas do ensino médio.
Projeto semelhante foi iniciado
também em 2003 pelo centro universitário UniverCidade, também
do Rio, que criou o Programa de
Apoio Pedagógico, com o objetivo de dar um reforço para estudantes em disciplinas em que foram constatadas um alto índice de
reprovação no primeiro ano. Entre os cursos oferecidos, também
estão os de texto e de matemática.
Em São Paulo, a universidade
UniCid detectou há quatro anos
essa necessidade e criou um programa de oficinas que tenta, entre
outras coisas, dar um atendimento personalizado a estudantes
com dificuldade ou vontade de
dominar um assunto necessário
para o acompanhamento das aulas. Uma das oficinas é a de texto.
A Uerj (Universidade do Estado
do Rio de Janeiro) também criou,
no ano passado, um programa de
reforço escolar para o conjunto de
seus estudantes.
O objetivo da Uerj era preparar
a universidade para a chegada dos
calouros que, pela primeira vez,
foram admitidos pelo sistema de
cotas raciais e para a rede pública.
As aulas desse programa são
abertas a todos os estudantes.
Neste ano, denominado Pró-Iniciar, o projeto tem aulas de inglês para universitários que não
tiveram a oportunidade de aprender o idioma no ensino médio.
"Com maior liberdade para elaborar o processo seletivo e por
causa de uma estratégia de mercado das instituições privadas, o
primeiro ano das universidades
passou a ser realmente o filtro que
indica se o aluno continuará estudando ou não. Não são estudantes despreparados intelectualmente, mas são alunos que podem ter perdido o hábito de
aprendizagem. Oferecer esse reforço aos estudantes é como dar
um voto de confiança na sua capacidade de aprender e reconhecer a realidade do ensino médio
público brasileiro", afirma o reitor da UniCarioca, Celso Niskier.
Denise Campos, pró-reitora-adjunta de ensino da UniCid, afirma que a universidade precisa assumir sua responsabilidade a partir do momento em que o estudante passa pelo processo seletivo
da instituição. "Em vez de colocar
a culpa no ensino médio e ficar lamentando a situação da educação, achamos que a universidade
deve assumir a sua responsabilidade. Não adianta querer se isentar e dizer que o estudante que
chegou à instituição já veio com
falhas do ensino médio", afirma.
Paulo Alonso, vice-reitor da
UniverCidade, concorda: "No
ano passado, iniciamos o programa com 95 estudantes. Neste ano,
já são 737. Isso mostra que é um
dever da universidade fazer com
que os alunos tenham acesso a
programas de nivelamento, principalmente aqueles de origem
mais humilde, que são os que
mais precisam".
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