São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Prefeitura faz muro sob viaduto para tirar moradores de rua

Subprefeitura da Lapa atendeu a pedidos de associações vizinhas e ergueu paredão de cerca de 5 metros para remover 30 sem-teto

Administração afirma que remoção foi feita para evitar incêndio na ponte, como o ocorrido em 2000, quando havia 55 famílias no local


RICARDO SANGIOVANNI
DA REPORTAGEM LOCAL

Construir um paredão cinzento de tijolo cru, sem portas nem janelas e com cerca de cinco metros de altura sob o viaduto Mofarrej, na Vila Leopoldina -bairro da zona oeste de São Paulo que atravessa um boom imobiliário- foi a alternativa encontrada pela Subprefeitura da Lapa para remover cerca de 30 moradores de rua que viviam no local havia nove meses.
A subprefeitura diz que a remoção foi feita para evitar risco de incêndio no viaduto, já que os moradores de rua acendiam fogueiras à noite, e que pretende ceder o local a uma entidade de reciclagem de lixo, para criação de uma cooperativa. Mas não sabe ainda quando isso será feito -no local, não há placa indicando que qualquer ação da prefeitura esteja em curso.
A construção do muro, concluída há pouco mais de três semanas, atendeu a pedidos de associações de empresários e de moradores do bairro para a "tomada de providência" em relação aos moradores de rua.
Coincidentemente, a Vila Leopoldina atravessa um momento de grande valorização imobiliária, com a atração de empreendimentos residenciais de alto padrão, para ocupar o lugar de antigos galpões industriais.
A meia quadra do paredão, está sendo construído o residencial Jardim Leopoldina Parque Clube, da construtora Rossi. Os apartamentos, na planta, custam entre R$ 353 mil e R$ 430 mil. Procurada pela Folha, a construtora não se manifestou.
Os moradores estavam instalados sob o viaduto desde que foram desalojados pela prefeitura do albergue Humaitá, que foi desativado. Cada um, diz a subprefeitura, recebeu R$ 5 mil de indenização. Além de morar sob o viaduto Mofarrej- onde já haviam construído casas de madeira e de papelão-, eles também armazenavam lixo, que era vendido para reciclagem.
"Tiram a gente, mas não dão outra opção. A gente só quer um lugar para trabalhar", afirma o catador de lixo Romildo Viviane, 42, pai de cinco filhos. Ele e outros dez catadores continuam armazenando lixo debaixo do viaduto -mas agora no meio da avenida, em frente ao paredão. O trabalho rende a cada um até R$ 700 por mês.
Além do pedido dos moradores do bairro, a prefeitura alegou como motivo para a construção do muro o risco de incêndios. O viaduto já pegou fogo em 2000, quando havia uma favela no mesmo local, e ficou três meses interditado.

Outros casos
Neste ano, ações semelhantes já foram realizadas embaixos dos viadutos Jaguaré, Lapa e Pompéia (região oeste). Entretanto, nos três casos, as remoções ocorreram antes que a cessão dos locais a entidades, para a criação de cooperativas, fosse concluída. Até o momento, nenhuma delas começou a funcionar.
"O histórico não é animador. A lógica dessas ações tem sido limpar a cidade da presença da pobreza e privilegiar a valorização imobiliária. É uma política higienista", diz o urbanista do Instituto Pólis, Kazuo Nakano.


Colaborou FERNANDA CRANCIANINOV , da Redação


Texto Anterior: Comemoração: Theatro Municipal do Rio faz 99 anos com reforma de R$ 50,2 mi
Próximo Texto: Frase
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.