São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 2002

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POLÍCIA FORA DA LEI

Integrantes do Gradi estiveram com os 12 membros do PCC dois dias antes da operação na Castelinho

PM podia ter antecipado ação de Sorocaba

ALESSANDRO SILVA
GILMAR PENTEADO

DA REPORTAGEM LOCAL

Os 12 supostos integrantes da facção criminosa PCC mortos em confronto com a Polícia Militar de São Paulo no pedágio da rodovia Castelinho (Sorocaba), em 5 de março deste ano, poderiam ter sido presos dois dias antes em Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo, em uma reunião em que se discutiram os últimos detalhes do assalto que eles planejavam.
Dois PMs do Gradi (Grupo de Repressão e Análise dos Delitos de Intolerância) e um preso recrutado, infiltrados na quadrilha, estiveram com todos os suspeitos no dia 3 de março, segundo relatório sigiloso da PM enviado para o Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais), em 12 de março.
O grupo poderia ter sido preso nesse momento ou antes de sair para o roubo, no dia 5. Pela lei, pouco mudaria. Se os 12 tivessem sido detidos, em vez de mortos, sem que houvesse o tiroteio no pedágio de Sorocaba que colocou em risco a vida de PMs e de civis, os suspeitos seriam acusados de formação de quadrilha, porte ilegal de armas e tentativa de roubo. Durante a reunião, dois dias antes do confronto, todos poderiam ter sido presos em flagrante por formação de quadrilha e porte de armas -já que, segundo o relatório, o armamento estava lá.
Outra possibilidade seria pegá-los nos dias seguintes. Em 3 de março, os PMs infiltrados já sabiam o ponto de partida dos suspeitos, em Itaquaquecetuba (grande São Paulo). ""Desse local, onde se encontravam as armas e os veículos, sairiam os integrantes da quadrilha", diz o documento da PM. Como não houve a prisão, o grupo cometeu dois crimes: roubou duas camionetes na capital, nos dias 3 e 4, para ir a Sorocaba. O mecânico Waldemar Kissel, 53, uma das vítimas, foi surpreendido por dois homens armados no Jabaquara (zona sul). ""Falei que não tinha seguro e falaram até em me matar", contou.
Não se sabe quantos crimes os 12 suspeitos cometeram nos 30 dias em que o Gradi monitorou o grupo sem prendê-los. Seis deles eram procurados, por assaltos, tráfico e até homicídio. ""Não se tinha controle sobre o que eles fizeram soltos", disse João José Sady, coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP.
A ação dos agentes do Gradi será investigada pelo Ministério Público. A mesma lei que trata da infiltração de agentes policiais (nš 9.034/95) e não prevê a participação de presos diz que a polícia pode retardar sua ação contra organizações criminosas, desde que mantida sob observação para obtenção de prova e informações.
""A conduta dos PMs será avaliada, porque o objetivo final da ação não parece ter sido o que previa o legislador", afirmou o promotor Rodrigo Canellas Dias, coordenador do Centro de Apoio às Promotorias Criminais do Estado, ao se referir às mortes na ação.
No relatório, o Gradi afirma que houve um estudo prévio do trajeto que seria usado no dia da ação e que se optou pelo ""ponto de menor risco" para os motoristas.
A escolha do momento certo para agir não é o único mistério da história. Um preso que trabalhou para o Gradi, Ronny Clay Chaves, 27, disse em depoimento que os detentos infiltrados pela PM teriam ""inventado" o assalto do avião em Sorocaba.
Em nota oficial, o Daesp (Departamento Aeroviário de São Paulo), responsável pelo aeroporto de Sorocaba, informou na época que a cidade não recebia mais vôos regulares de transporte de valores. Até hoje, não se identificou qual seria o alvo deles.
Segundo a Folha apurou, um dos presos recrutados pelo Gradi e que trabalhou no caso de Sorocaba, Marcos Massari, já foi indiciado por assalto a avião pagador e era conhecido entre os criminosos por esse feito. Ele teria convencido os 12 suspeitos a agir.
Quando a operação do Gradi aconteceu, as autoridades de segurança estavam sob pressão por uma série de fatos, como os atentados a bomba do PCC, rebeliões e o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT).
A ação na Castelinho recebeu elogios do secretário Saulo de Castro Abreu Filho (Segurança Pública), que agora será investigado pelo TJ por causa dos métodos usados pelo Gradi. Ele nega que sabia das operações com presos.
O Comando da Polícia Militar informou ontem que todas as ações do Gradi estão sendo apuradas e que a corporação irá se manifestar depois disso.


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