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INCULTA & BELA
"O que você quer que eu faça?"
PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha
Nas últimas colunas, discutimos aspectos interessantes
dessa classe de palavras que
tantos matizes apresenta.
Já falamos do imperativo.
Agora vamos falar do subjuntivo. Para quem já esqueceu,
os modos verbais são três.
Além do imperativo e do subjuntivo, temos o indicativo.
O subjuntivo expressa hipótese, possibilidade, dúvida,
desejo. É por isso que se diz
"Quero que você faça", e não
"Quero que você faz".
Meu querer não basta para
que você faça. Até de fato fazer, só existe a possibilidade
de que você faça.
A mesma situação se verifica em frases como "É fundamental que você compareça".
Por mais que seja fundamental, seu comparecimento
-antes que de fato ocorra-
não passa de mera hipótese.
Na língua do dia-a-dia, em
algumas regiões do país -São
Paulo, por exemplo-, o subjuntivo desaparece em frases
como "O que você quer que eu
faça?". É comum que esse "faça" vire "faço" ("O que você
quer que eu faço?").
"Você quer que eu leio?",
"Você quer que eu vou", "Ele
não quer que eu saio" também
são correntes.
Escritas, essas frases chocam. Na fala, são comuns.
Talvez haja explicação para
isso. O indicativo expressa
certeza, garantia. E as pessoas
talvez prefiram o indicativo
porque têm certeza de poder
concretizar o ato. Afinal, a
pergunta é "Você quer que
eu...?". Sou eu que faço.
Não custa repetir que o uso
do indicativo no lugar do subjuntivo não é comum em todas as regiões do país. Caetano Veloso um dia me disse
que assistiu a um episódio do
"Nossa Língua Portuguesa"
em que discuto essa questão.
"O que você disse sobre o indicativo no lugar do subjuntivo
é verdade, mas não vale para
o Brasil inteiro. Na Bahia não
é assim", afirmou.
E Caetano tem razão. Lá é
normal que se diga "O que
você quer que eu faça/diga?"
Às vezes, a escolha entre o
subjuntivo e o indicativo é
fundamental para decidir o
sentido da frase. O que você
diria: "Eles insistem em que
você participe" ou "Eles insistem em que você participa"?
Depende. Se a opção for por
"participe", subjuntivo, manifesta-se o desejo de que você
participe. Você ainda não
participa, mas eles desejam isso.
Se a opção for por "participa", muda tudo. Eles passam
a sustentar a tese de que você
participa, ou seja, eles afirmam que você participa. O
que existe, no fundo, é quase
uma denúncia.
Como se vê, a escolha do
modo verbal não é gelada, seca. O modo pode definir a intenção ou, em última análise,
o sentido da frase.
Volto ao tema. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna
às quintas-feiras
E-mail: inculta@uol.com.br
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