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LETRAS JURÍDICAS
Atualidade da República proclamada
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Não se pode nem se deve
voltar ao passado para
perguntarmos se estaríamos melhor do que estamos se o Império
do Brasil não houvesse sido substituído pela República dos Estados Unidos do Brasil em 1889. Seria perda de tempo, pois os elementos modificadores, na história do século 20, foram tão importantes que geraram a impossibilidade de imaginar os efeitos da vida reformulada nos setores público e privado.
O marechal Deodoro da Fonseca, talvez não muito cônscio do
que estava fazendo, foi levado a
proclamar a República. Isso significou que, afastada a monarquia,
em cuja administração imperial
predominavam pessoas da mesma família, reservados, para elas,
bons postos e (eventualmente) até
bons negócios, veio a República.
Com "r" minúsculo, a palavra república tem uma série grande de
significados. No sentido que nos
interessa, situa o Brasil de hoje
como país cujo governo geral é
acessível a todos os cidadãos (com
pouquíssimas e justificáveis exceções), respeitada a Constituição.
A república é, como a monarquia, apenas uma forma de governo. Há exemplos bem-sucedidos e malsucedidos de ambas ao
longo do tempo em várias partes
do planeta. A Carta de 1824, a primeira de nossa história, começava dizendo que o Império (assim
mesmo, com maiúscula) do Brasil
era a associação política de todos
os cidadãos brasileiros, muito
embora não lhes dispensasse tratamento absolutamente igualitário. Mais à frente, afirmava ter
governo monárquico, hereditário, constitucional e representativo. Sobreveio a república, nos
moldes da Constituição dos Estados Unidos da América do Norte.
O Brasil republicano nasceu neste
mesmo dia, há 114 anos. Aprovou
sua Constituição em 1891, para
dizer: "A Nação Brasileira (assim,
em maiúsculas) adota como forma de governo, sob regime representativo, a República Federativa...". Os constituintes do século
19 tiveram a cautela pioneira de
mandar reservar 14,4 mil quilômetros quadrados "no planalto
central da República, para nela
estabelecer-se a futura capital federal", cuja realização exigiu
quase mais 70 anos. Eram movidos pelo desejo de estender o domínio efetivo do território a toda
a área do país, coisa impensável
para quem habitava o Rio de Janeiro do século 19. O povo vivia à
moda dos mariscos, grudado na
orla marítima.
O governo representativo, tomado em si mesmo, não é necessariamente prerrogativa da república. A Arábia Saudita é monárquica e não tem governo eleito
por seu povo. Quem manda é a
família Saud, é a elite. A Inglaterra é monárquica e tem governo
eleito, despojada a rainha do poder de mando. Na Carta de 1988,
o nome de nosso país passou a ser
República Federativa do Brasil,
pois constitui federação de Estados autônomos entre si e em face
da União. O conceito de federação é relativamente amplo, mas
tem o sentido de associação indissolúvel entre Estados, municípios
e Distrito Federal.
A avaliação crítica do cotejo entre o nome adotado e a realidade
vigente mostra que a federação
brasileira precisa corrigir as distorções com as quais sua história
vem sendo marcada. Apesar da
falha, o sistema republicano tem
sido confirmado sucessivamente
pelo povo, não parecendo possível
nenhuma mudança. A estrutura
governativa, entretanto, tem
mostrado deficiências graves, nas
quais predomina a crescente insegurança das pessoas ante o aumento da violência e o desrespeito
à propriedade, em particular na
área rural. Os movimentos sociais
são úteis, apesar dessa restrição,
por estimular reformas destinadas a aperfeiçoar o sistema de relações entre segmentos da
sociedade.
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