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São Paulo, sábado, 15 de novembro de 2003

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LETRAS JURÍDICAS

Atualidade da República proclamada

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Não se pode nem se deve voltar ao passado para perguntarmos se estaríamos melhor do que estamos se o Império do Brasil não houvesse sido substituído pela República dos Estados Unidos do Brasil em 1889. Seria perda de tempo, pois os elementos modificadores, na história do século 20, foram tão importantes que geraram a impossibilidade de imaginar os efeitos da vida reformulada nos setores público e privado.
O marechal Deodoro da Fonseca, talvez não muito cônscio do que estava fazendo, foi levado a proclamar a República. Isso significou que, afastada a monarquia, em cuja administração imperial predominavam pessoas da mesma família, reservados, para elas, bons postos e (eventualmente) até bons negócios, veio a República. Com "r" minúsculo, a palavra república tem uma série grande de significados. No sentido que nos interessa, situa o Brasil de hoje como país cujo governo geral é acessível a todos os cidadãos (com pouquíssimas e justificáveis exceções), respeitada a Constituição.
A república é, como a monarquia, apenas uma forma de governo. Há exemplos bem-sucedidos e malsucedidos de ambas ao longo do tempo em várias partes do planeta. A Carta de 1824, a primeira de nossa história, começava dizendo que o Império (assim mesmo, com maiúscula) do Brasil era a associação política de todos os cidadãos brasileiros, muito embora não lhes dispensasse tratamento absolutamente igualitário. Mais à frente, afirmava ter governo monárquico, hereditário, constitucional e representativo. Sobreveio a república, nos moldes da Constituição dos Estados Unidos da América do Norte. O Brasil republicano nasceu neste mesmo dia, há 114 anos. Aprovou sua Constituição em 1891, para dizer: "A Nação Brasileira (assim, em maiúsculas) adota como forma de governo, sob regime representativo, a República Federativa...". Os constituintes do século 19 tiveram a cautela pioneira de mandar reservar 14,4 mil quilômetros quadrados "no planalto central da República, para nela estabelecer-se a futura capital federal", cuja realização exigiu quase mais 70 anos. Eram movidos pelo desejo de estender o domínio efetivo do território a toda a área do país, coisa impensável para quem habitava o Rio de Janeiro do século 19. O povo vivia à moda dos mariscos, grudado na orla marítima.
O governo representativo, tomado em si mesmo, não é necessariamente prerrogativa da república. A Arábia Saudita é monárquica e não tem governo eleito por seu povo. Quem manda é a família Saud, é a elite. A Inglaterra é monárquica e tem governo eleito, despojada a rainha do poder de mando. Na Carta de 1988, o nome de nosso país passou a ser República Federativa do Brasil, pois constitui federação de Estados autônomos entre si e em face da União. O conceito de federação é relativamente amplo, mas tem o sentido de associação indissolúvel entre Estados, municípios e Distrito Federal.
A avaliação crítica do cotejo entre o nome adotado e a realidade vigente mostra que a federação brasileira precisa corrigir as distorções com as quais sua história vem sendo marcada. Apesar da falha, o sistema republicano tem sido confirmado sucessivamente pelo povo, não parecendo possível nenhuma mudança. A estrutura governativa, entretanto, tem mostrado deficiências graves, nas quais predomina a crescente insegurança das pessoas ante o aumento da violência e o desrespeito à propriedade, em particular na área rural. Os movimentos sociais são úteis, apesar dessa restrição, por estimular reformas destinadas a aperfeiçoar o sistema de relações entre segmentos da sociedade.


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