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SAÚDE
ONGs reclamam da imagem de mulher-objeto da cantora, mas, para ministério, polêmica é "saudável"; doença cresce entre jovens
Campanha contra a Aids começa hoje com Kelly Key
DÉBORA YURI
DA REVISTA
A escolha da cantora Kelly Key,
19, mais recente fenômeno "teen"
no universo da música pop nacional, provocou uma polêmica como há muito não se via nas campanhas de prevenção à Aids do
Ministério da Saúde. A estréia da
campanha deste ano acontece hoje, durante o programa "Sandy &
Junior", da Rede Globo.
ONGs ligadas a portadores de
HIV reclamaram de sua imagem
de mulher-objeto. Para educadores, ela -mãe aos 17- seria o
contra-exemplo para jovens.
Em plena polêmica, uma enquete feita pela Folha Online, sem
valor de amostragem científica,
revelava ampla vantagem para o
coro dos contrários.
Até as 19h da última quinta-feira, 62% dos 3.030 votantes na Folha Online achavam que KK não
tinha credibilidade para pregar
sexo seguro. Outros 22% consideravam que sim ("Ela tem grande
influência sobre os adolescentes"), e 16% acreditavam que a escolha poderia funcionar ("Ela gera polêmica e isso contribui para a
divulgação").
É a esse último ponto que o ministério se agarra. "Não me arrependo da opção. A polêmica é
saudável, porque a campanha ganhou notoriedade antes mesmo
de ir ao ar", disse o ministro da
Saúde, Humberto Costa, 45.
A escolha de KK se amparou no
fato de a Aids estar ficando mais
feminina e mais jovem. Segundo
o levantamento mais recente do
ministério (março de 2002), na
década de 80, a média era de 6,5
casos masculinos para cada caso
feminino. De 91 a 2001, essa proporção caiu para 2,4.
A situação é mais dramática na
faixa etária entre 13 e 24 anos, exatamente o público-alvo da campanha. As novas ocorrências registradas de 2000 a março de 2002
mostram que as meninas infectadas foram 1.904, contra 1.842 meninos. Dos doentes notificados de
1980 a 2002, as jovens dessa faixa
etária representam 16% do universo feminino infectado, e os rapazes, 11% do masculino.
Os especialistas afirmam que o
maior problema são as adolescentes das classes C e D que estão na
periferia dos grandes centros urbanos. "As meninas estão transando cada vez mais cedo, com
homens mais velhos, e têm dificuldade em negociar o uso do
preservativo com eles", explica o
ministro da Saúde.
"A Kelly Key vende uma imagem de mulher jovem que tem
poder de decisão numa relação a
dois", afirma o ministro da Saúde.
Boa parte da polêmica reside na
contestação dessa crença.
"Se uma menina do morro falar
com o parceiro como a Kelly Key
canta em suas músicas, leva uma
porrada na cara", diz Willian
Amaral, 36, secretário-geral da
ONG Pela Vidda, do Rio.
Poucas propagandas foram recebidas sem debates. Cristina Gutemberg, 42, coordenadora da
produção das campanhas do governo desde 94, se lembra de duas
que ganharam a "simpatia" de todos: a de 99, que mostrava Regina
Casé cantando marchinhas carnavalescas, e a de 97, em que perus dançavam ao som da música
"Bota a camisinha nele".
Cristina já coloca a de KK no
pódio das barulhentas -e acha
isso muito bom. "Todo mundo
está comentando e é preciso ter
repercussão para funcionar."
Fazer barulho, porém, não é tudo, asseguram os profissionais da
publicidade. "A polêmica só funciona quando é pertinente", diz
Washington Olivetto, criador do
primeiro comercial de preservativos da história da TV brasileira,
em 1981. Ele não acredita que a
busca da polêmica tenha sido deliberada, mas defende Kelly Key
do tiroteio. "Acho meio provinciana essa coisa moralista em cima dela. Se fosse usada uma figura masculina com esse perfil popular e sexualmente explícito, ele
não levaria tanta porrada."
O publicitário Alexandre Gama,
presidente da agência Neogama,
conta que são raros os clientes
que apostam no "falem mal, mas
falem de mim". "Na verdade, a
maioria não quer polêmica alguma. Depois, a polêmica passa e a
sujeira fica com a marca", diz.
Não é esse o caso desta vez, ressalva. "Eles escolheram alguém que
funciona. Como não está se vendendo nada nessa campanha, só
levando informação, gostar ou
não fica um pouco de lado. Nesse
caso, o barulho é positivo, porque
traz um assunto sério à tona."
Colaboraram Lulie Macedo e Roberto de
Oliveira
LEIA a reportagem completa da Revista
no site www.uol.com.br/revista
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