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São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 2003

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URBANIDADE

Direito à paisagem

ALTAR DA PÁTRIA Reflexão abaixo das esculturas de Ettore Ximenes (italiano, criticado pelos modernistas por ser "acadêmico"): a história cede frequentemente ao impulso de derrubar estátuas e, com poucas exceções, manda os homens a combater por isso; contudo parece oportuno distinguir entre guerra e guerra justa, quando os mortos (e as estátuas) são amontoados de um lado só. (VINCENZO SCARPELLINI)


GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

O movimento de resistência começou silenciosamente quando os moradores dos chamados "predinhos" de Pinheiros descobriram que uma construtora, reverente ao estilo neoclássico, tinha comprado um estacionamento nas imediações.
Além do desgosto estético de viver ao lado de um monstrengo neoclássico, sentiram-se vulneráveis: mais cedo ou mais tarde, viriam para os proprietários dos "predinhos" as propostas de compra dos seus imóveis. Os terrenos ali atraem, há muito tempo, a cobiça de especuladores e de construtores.
Erguidos na década de 40, aqueles 21 prédios de três andares -dois apartamentos por andar- transformaram-se numa espécie de oásis urbano. Os apartamentos são silenciosos, amplos, iluminados, com pé-direito alto, cercados de jardim. Com um generoso recuo da rua, não exibem muros, como se não se rendessem ao pânico paulistano.
É uma rara paisagem provinciana, apesar de os prédios estarem localizados entre a avenida Rebouças e a rua Teodoro Sampaio -uma barulhenta região na fronteira com a Vila Madalena. "É refúgio", conta o morador Daniel Annenberg. Essa cumplicidade facilitou os encontros informais para que se tramasse a resistência imobiliária.
O problema é que os simpáticos "predinhos" não têm valor arquitetônico nem histórico. Não se sabia como garantir sua conservação. Apelaram, então, para Paulo Bastos, um dos mais famosos arquitetos paulistanos -é o responsável pela restauração da catedral da Sé e está fazendo os planos da revitalização do gasômetro, no Brás, e da "cracolândia". De resto, ele mora na região. "Aquele conjunto faz parte da paisagem paulistana e, por isso, merece ser preservado", justificou, dizendo que os "predinhos" são exemplo de bom gosto e respeito ao trânsito das ruas.
Montou-se, então, um arrazoado técnico com base no direito à paisagem, apresentado pelos moradores às entidades de preservação do patrimônio. Ganharam a simpatia do arquiteto Jorge Wilheim, secretário municipal do Planejamento. "Gosto da idéia", afirma.
Nesta semana, o movimento de resistência recebeu a notícia de que está prestes a vencer a guerra: o conselho municipal que cuida do patrimônio da cidade deu indicações de que os pequenos edifícios serão tombados -e farão parte para sempre da paisagem paulistana.

E-mail - gdimen@uol.com.br


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