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ENTREVISTA
Seminário no Acre debate impacto das drogas no sistema de saúde
DA REPORTAGEM LOCAL
O Estado do Acre faz divisa com
a região que mais produz coca no
mundo -a selva amazônica da
Colômbia, Peru e Bolívia. Partindo da capital, Rio Branco, em
duas horas de carro chega-se à
Bolívia por duas estradas. Em três
horas, uma terceira leva ao Peru.
O rio Purus, que vem do Peru e
vai desembocar no Solimões, é
outro caminho para a droga. Ao
longo dessas estradas e rio, várias
cidades sofrem com a passagem
de traficantes e o trânsito de prostitutas e caminhoneiros. No rastro dessas populações, transitam
doenças como hepatites B e C, tuberculose e o vírus HIV.
Populações indígenas, presentes em todos os Estados do Norte,
são ameaçadas pelo alcoolismo e
pela Aids. O Acre tem uma prevalência da doença que corresponde
à metade da média nacional -2,5
casos notificados por 100 mil habitantes, segundo boletim da
Coordenação Nacional de Aids
que ainda será divulgado. Mas um
único caso pode dizimar uma tribo inteira, já que suas práticas sexuais dificultam o trabalho de
prevenção, dizem técnicos do Ministério da Saúde. A tendência, no
Norte, é de crescimento dos casos.
"O álcool é um problema gravíssimo entre os índios", diz a psicóloga Helena Lima, que trabalha
com redução de danos em regiões
de fronteira. Por conta de tantos
desafios, o Estado do Acre realizou semana passada, em Rio
Branco, o seminário Construção
da Política Estadual sobre Drogas.
O encontro reuniu representantes de várias instâncias nacionais
e internacionais que lidam com
drogas e saúde, associações de redução de danos, representantes
do Ministério da Saúde, das Nações Unidas e de vários países sul-americanos. "Apesar da situação
vulnerável em que nos encontramos, a gestão do governo Jorge
Viana (PT) tem tido sucesso tanto
na repressão como na prevenção
das drogas", diz Cassiano Marques, 33, secretário da Saúde. "O
desafio, agora, é uma rede para
tratamento de dependentes", diz.
Abaixo, trechos da entrevista
que o secretário deu por telefone:
(AURELIANO BIANCARELLI)
Folha - O que mais está preocupando as pessoas que trabalham
com drogas no Estado?
Cassiano Marques - Antes era a
merla ou mescla, uma substância
anterior à cocaína em pó. Essa
pasta, que custa bem menos, é fumada misturada com cigarro ou
maconha. Agora, a preocupação é
com o "oxidado", um substrato
da merla, que custa mais barato
ainda e que é preparado misturando-se com cal, querosene e gasolina. Essa droga é fumada, como a merla, mas, além de provocar danos rápidos à saúde, vicia
mais rapidamente que o crack.
Folha - E a prostituição?
Marques - Apesar dos melhores
cuidados em saúde no Brasil, o
trânsito se dá em direção principalmente à Bolívia. Lá, elas são
mais toleradas e chegam a ser cadastradas. Do ponto de vista institucional, a Bolívia avançou mais
nessa questão. Mas a proximidade com a fronteira facilita a entrada e o uso de silicone industrial,
pelos travestis; e o emprego de
anabolizantes, que causam danos
sérios à saúde e que também chegam pelas fronteiras.
Folha - E na questão do tratamento de pacientes, como os países vizinhos se entendem?
Marques - É uma questão que
estamos discutindo com os departamentos da Bolívia e do Peru.
Eles não oferecem tratamento de
alta complexidade e doentes de
câncer e urgências são trazidos
para cá. Também não oferecem o
coquetel, e nós não estamos negando [esse serviço a eles]. A prevenção é outro problema, pois
aqui os grupos de risco recebem
kits com preservativos e informações, o que não acontece do outro
lado das nossas fronteiras.
Folha - Há também usuários de
drogas injetáveis na região?
Marques - Também há. Nossa
estratégia está sendo a redução de
danos, com troca de seringas e informações, trabalho exemplar
que a Reard (Rede Acreana de Redução de Danos) vem realizando.
Outra prioridade está sendo o
atendimento de dependentes de
álcool e drogas em hospital geral.
Nossa intenção é aumentar o número de centros que possam desenvolver um atendimento multidisciplinar, com psicólogos, assistentes sociais e e terapeutas ocupacionais.
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