São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

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OBRA FARAÔNICA

Prefeito de Paulínia vai gastar valor equivalente ao Orçamento deste ano em reforma que inclui "manto de cristal"

Após portal futurista, cidade terá pirâmide

FERNANDA BASSETTE
FREE-LANCE PARA A FOLHA CAMPINAS

A Prefeitura de Paulínia (126 km de SP) vai gastar com as obras de revitalização do centro e as construções de uma rodoviária-shopping e de um novo portal temático na entrada da cidade R$ 153 milhões, quase o total gasto em um ano com as secretarias de saúde e educação ou cerca da metade do Orçamento previsto para 2004.
Só com a obra do manto de cristal -espécie de pirâmide de vidro que encobrirá a Igreja São Bento-, serão gastos R$ 98 milhões. A saúde, considerada área essencial do governo, tem disponível para 2004 R$ 50 milhões.
Com uma altura equivalente à de um prédio de dez andares, mezanino para exposições, mirante e elevador panorâmico, além de um estacionamento subterrâneo com capacidade para cem veículos, a pirâmide terá ainda uma catacumba para guardar as cinzas e os ossos dos párocos que atuam ou já atuaram na cidade, como forma de homenageá-los.
A obra da rodoviária-shopping já está em fase de conclusão e custou R$ 55 milhões aos cofres públicos -R$ 10 milhões a mais que o Orçamento anual da Prefeitura de Nova Odessa, cidade do mesmo tamanho de Paulínia. Além da rodoviária, o local abriga um complexo de 60 lojas, hipermercado, salas de cinema e café-bar.
Outra obra que começa ainda neste semestre será a construção de um novo portal para a entrada da cidade, que custará R$ 1,4 milhão. Paulínia já tem quatro portais temáticos nas principais vias de acesso: medieval, futurista, colonial e harmonia.
O novo portal será o egípcio, com custo de R$ 1,4 milhão. Ele terá duas colunas laterais e uma central, com imagem egípcia.
O valor investido na construção do novo portal é bem superior ao que deverá ser investido neste ano no departamento de gestão ambiental da cidade: R$ 890 mil.
A inspiração para realizar e desenvolver tais obras é fruto da imaginação do próprio prefeito Edson Moura (PMDB), segundo sua assessoria de imprensa.
"Ele imagina e cria todas as suas obras. É um inventor. Ele passa tudo rascunhado detalhadamente para o arquiteto, que só coloca a idéia do prefeito no papel", conta o presidente da Câmara, Jaime Donizete Pereira (PMDB), afilhado político do prefeito.

Problemas
Com um Orçamento anual de R$ 350 milhões e IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,847 -um dos mais altos do Estado-, Paulínia não veria polêmica nas obras suntuosas do prefeito se na cidade não existissem problemas sociais.
Com 51 mil habitantes, o município tem um déficit de 3.500 moradias. Pelo menos quatro bairros não têm asfalto. Há um déficit de 500 vagas nas creches. Todo esgoto do município é despejado sem tratamento no rio Atibaia.
A Folha procurou pelo prefeito por duas semanas, mas foi informada que só a assessoria de imprensa se pronunciaria. Moura, que está em seu segundo mandato (o primeiro foi de 1993 a 1996), raramente concede entrevistas.
O prefeito também não autorizou os secretários da administração a conversar com a Folha.
Além de colecionar obras faraônicas, Moura transforma alguns de seus atos em espetáculo.
Em março deste ano, por exemplo, o prefeito determinou que o expediente dos servidores públicos municipais fosse encerrado às 15h e pediu que todos se dirigissem a um centro de eventos na cidade sem comentar o motivo do encontro. "Chegando lá descobrimos o motivo. Ele queria anunciar um abono de mais R$ 500 para todos os servidores. Assim ele ganha a simpatia das pessoas", disse o secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Paulínia, Vonei Amorim.


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