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São Paulo, terça-feira, 16 de setembro de 2003

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POLÍCIA SOB SUSPEITA

Um delegado, dois investigadores e um agente são acusados de envolvimento com o contrabandista Lobão

Decretada prisão de mais 4 policiais em SP

GILMAR PENTEADO
ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Justiça de São Paulo decretou ontem a prisão temporária, por cinco dias, de quatro policiais civis -um delegado, dois investigadores e um agente- por suposta participação em uma rede de crimes descoberta por acaso quando se investigava os negócios do homem considerado o maior contrabandista de cigarros do país, Roberto Eleutério da Silva, conhecido como Lobão.
Eles são suspeitos dos crimes de prevaricação, formação de quadrilha, estelionato e concussão (extorsão cometida por funcionário público). As quatro prisões foram pedidas, segundo o Ministério Público Estadual, após análise dos grampos telefônicos reunidos em uma apuração da Procuradoria da República de Brasília e do depoimento de uma testemunha.
"Ficamos perplexos e estarrecidos com o cenário e a gravidade dos fatos", disse o promotor José Carlos Blat, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), que integra a força-tarefa montada para apurar o caso. A juíza-corregedora do Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais) da capital, Ivana David Boriero, é a responsável pelo inquérito. A polícia será chamada para cumprir ordens judiciais.
Entre as cerca de 40 mil conversas gravadas, durante nove meses, segundo a Folha apurou, há diálogos que mostram um delegado "encomendando" um roubo de carga, pessoas "comprando" boletins de ocorrência de assalto para desviarem cargas, policiais negociando com traficantes drogas apreendidas e dando orientações sobre a remarcação de chassis de veículos em desmanches. A rede envolveria outros policiais não relacionados no pedido de prisão.
Os grampos chegaram até mesmo à cúpula da Polícia Civil. Entre os monitorados está o delegado Luiz Carlos dos Santos, o China, assessor do delegado-geral da Polícia Civil do Estado, Marco Antonio Desgualdo. Santos nega ter participado do esquema.
Ontem, agentes da força-tarefa cumpriram mandados de busca e apreensão de documentos em duas delegacias da capital -33º DP (Pirituba) e 10º DP (Penha)-, em desmanches e escritórios que serviriam como bases da suposta rede policial criminosa.
O agente Jean Wagner Cabral e o investigador José Norberto dos Santos, do 10º DP, foram presos às 17h45 de ontem, após depor na CPI da Pirataria da Câmara dos Deputados. O Dipo também decretou a prisão temporária do delegado Nicola Romanini e do investigador Ivan Raimund Barbosa, que eram do 33º DP.
Cabral e Santos negaram à CPI envolvimento no esquema de corrupção, mas confirmaram um episódio, em fevereiro, em que uma carga apreendida foi liberada por influência de Lobão. Cabral disse que recebera a ordem do delegado Hectore Capalmo Sobrinho, chefe do setor de investigações da Seccional Leste.
Dois dias depois, o agente informou que um motoboy entregou a ele, na delegacia, um envelope com seu nome, com US$ 3 mil. Cabral disse ter devolvido o dinheiro ao próprio Lobão.
O delegado Capalmo Sobrinho foi ouvido ontem pela CPI e negou ter dado a ordem a Cabral. Os dois foram submetidos a acareação e mantiveram suas versões.
Os deputados não se convenceram com as explicações de Santos e Cabral. Para o presidente da CPI, deputado Luiz Antonio Medeiros (PL-SP), grampos mostram que Cabral tentou extorquir dinheiro de Lobão, que teria se revoltado por já pagar propina para policiais da região.
Na CPI, Cabral disse que tudo ocorreu em um sábado no mês de fevereiro passado. Apesar de ser agente -cuja função principal é de dirigir carros da polícia-, Cabral afirmou que resolvera verificar uma denúncia de um galpão suspeito na Lapa.
Além de o bairro ficar fora da área de seu distrito, ele usou carro particular. No local, após apreender um caminhão, Cabral disse que recebeu um telefone do delegado Capalmo Sobrinho afirmando que era para deixar o local.
Cabral disse que comunicou o fato a Santos, que era chefe dos investigadores, e deixou o local. Na segunda-feira, foi surpreendido com um envelope com US$ 3 mil. Cabral e Santos confirmam que o caminhão foi liberado e Lobão ligou várias vezes para o 10º DP reclamando da operação.
Santos disse que Lobão também afirmava, ao fazer ameaças por telefone, que iria reclamar ao "número 1", mas não dizia o nome.


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