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Casarão foi feito com óleo de baleia
DA REDAÇÃO
Quando a lajota avermelhada
do piso se soltou, Elza não se abalou. Habilidosa, ela desenhou na
argamassa recém-exposta arabescos sem forma. A mesma preocupação com os detalhes se nota no
cuidado com que grampeou os tecidos às ripas de madeira para segurar o forro apodrecido.
Com infiltração e rachaduras.
Assim se encontra o casarão de
número 595 da rua Rui Barbosa,
na Bela Vista, na região central de
São Paulo, tombado pelo Conpresp (Conselho Municipal de
Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da
Cidade de São Paulo).
Sem pensão, a artista plástica Elza Maria Prado Ferreira da Rocha,
53, depende do aluguel dos quartos do andar de baixo da casa onde mora para ter renda no fim do
mês. Dos oito cômodos destinados à locação, seis estão ocupados
por dez inquilinos, o que lhe permite juntar cerca de R$ 1.000 no
fim do mês. Os moradores e mais
um dos sete filhos de Elza que moram na edícula dividem os dois
banheiros do andar térreo. Há
duas pias no quintal, que também
precisam ser compartilhadas.
No andar de cima, Elza vive
com um filho e mais dois netos,
de três e um ano. Um dos cômodos virou cozinha. A pia fica no
corredor. "Não sei por que é aqui.
Só sei que não posso mudar por
causa do cano", explica, sem jeito.
Ela lamenta o estado de conservação da casa onde nasceu e que
mais tarde herdou da avó. Datado
de 1923, o imóvel foi construído
com areia, óleo de baleia e sal
grosso, conta. "Desde quando minha avó comprou a casa, em 1950,
ela fez daqui uma pensão. Mas era
diferente, havia uma sala de jantar, onde eram servidas as refeições para os inquilinos."
Criada em um meio cultural influente, Elza foi casada com um
músico. Soprano, ela também fazia apresentações. "Participei de
musicais, como Jesus Cristo Superstar", relembra nostálgica.
Por ser um imóvel tombado, Elza poderia se beneficiar de políticas de incentivos, como isenção
de IPTU por determinado tempo,
para reformar a casa.
"Mas e para conseguir o dinheiro?", indaga. "E mão-de-obra
também é cara, precisa ser especializada." Em seguida, aponta
para os degraus da entrada: "É tudo mármore de Carrara".
Separados por uma igreja batista, construída no terreno antes
ocupado por duas casas que compunham a série de oito imóveis de
fachadas idênticas, o casarão de
dona Elza e o de número 613 da
rua têm algo a mais em comum
além da arquitetura. Lá também
funciona um cortiço.
São nove famílias vivendo em 12
cômodos, alguns no porão da casa, onde o cheiro de umidade chega a incomodar. Há 12 anos em
São Paulo e há três vivendo nesse
cortiço, a baiana Darina Souza
Gomes, 35, diz que agora a situação está bem melhor. "Saí daquele
quartinho no porão e me mudei
para esse aqui, muito mais arejado", aponta para as janelonas que
dão para a rua. "Meu filho nem teve mais bronquite", diz, feliz com
o estado de saúde de Gregory, 5.
"Agora estou mais tranqüila. Até
a luz foi religada depois de um
mês na escuridão. Foi falta de pagamento mesmo."
(FC)
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