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GILBERTO DIMENSTEIN
Por que Supla vence Lula
Provocada por uma brincadeira desta coluna, uma
empresa de pesquisa de opinião
resolveu incluir o nome do roqueiro Supla numa lista de presidenciáveis para medir até onde
vai a influência da mídia nas eleições.
Por causa do impacto do programa "Casa dos Artistas", perguntei, duas semanas atrás, a dirigentes dos três mais importantes institutos de opinião do Brasil
(Datafolha, Vox Populi e Ibope) o
que aconteceria se Supla entrasse
na lista, apresentado como uma
opção ao Palácio do Planalto.
Todos, sem exceção, apostaram
que ele seria apontado como candidato -e mais: disseram que
não se surpreenderiam caso aparecesse bem colocado.
Há anos fazendo pesquisas sobre a imagem dos meios de comunicação, a CPM Market Research
entrevistou, na semana passada,
368 habitantes da cidade de São
Paulo, pertencentes às classes A, B
e C. A impressão daqueles dirigentes do Ibope, do Datafolha e
do Vox Populi estava certa.
Supla surge em quarto lugar,
com 13% das intenções de voto,
acima de Ciro Gomes (10%) e de
Anthony Garotinho (8%). Está
atrás não só de José Serra (19%)
como também de Roseana Sarney
e de Lula, ambos empatados em
22%. Levantamento divulgado
na quinta-feira passada pela pesquisa CNT/Sensus também mostrou Lula e Roseana em empate
técnico.
Já seria excelente ter 13% logo
de saída, sem ao menos se apresentar como candidato. Seu melhor resultado, porém, é entre os
jovens de 16 a 19 anos. Nesse segmento, Supla está simplesmente
em primeiro lugar, com 26%, batendo Lula, que fica nos 21%.
Surpreendente esse primeiro lugar? Nem tanto.
Com o final previsto para hoje, a
"Casa dos Artistas" é o maior fenômeno de audiência dos últimos
tempos. Fez de Supla uma espécie
de herói televisivo, um personagem da vida real envolvido numa
trama novelesca em tempo real.
Num país de espertos e metidos a
espertos, ele passou a imagem de
ser alguém respeitoso e responsável. Até aí, apenas o óbvio.
Quem acompanha as investigações sobre os humores e as perspectivas do jovem brasileiro sabe
que a vitória de Supla, nessa faixa
etária, era absolutamente previsível. Eles acham que política é sinônimo de desonestidade e que
quase todos os políticos são malandros. Apostam muito mais em
meios individuais para prosperar
do que em projetos de nação.
Olham ao redor e vêem a pobreza, a violência e a destruição da
natureza como sinais de fracasso
da ação pública. Quando nasceram, a ditadura já estava encerrada. Não participaram, portanto, da cumplicidade da conquista
da democracia.
Valoriza-se obsessivamente a
busca do sucesso e do dinheiro, o
que se traduz em investir nos estudos e no trabalho. Seria injusto
dizer que essa é uma geração sem
sonhos. Os jovens identificam-se
nas ações voluntárias, geridas pelo chamado terceiro setor: querem fazer a diferença com as próprias mãos, sem intermediários.
É, em essência, uma geração
mais pragmática, absorvida pelo
tempo real, tomada pela era do
conhecimento, com seus novos
padrões de comunicação, marcados pela interatividade e pela
abundância de informações.
O discurso dos candidatos é velho, carcomido, cheio de chavões.
Promete a felicidade por meio da
ação do poder público -mas os
jovens não confiam no poder público. Ao lado dessa despolitização, misturada com o ceticismo
crônico do brasileiro diante dos
políticos, existe também a simples
ignorância. Muita gente não entende o que os candidatos dizem,
consequência do analfabetismo
funcional -ou seja, o indivíduo
lê, mas não entende.
Na semana passada, uma pesquisa do Instituto Paulo Montenegro (ligado ao Ibope) em parceria com a Ação Educativa, uma
entidade não-governamental, feita com brasileiros entre 16 e 54
anos, chegou à conclusão de que
apenas 26% deles conseguem ler e
entender um livro. Constataram
que a deficiência de entendimento consegue chegar até a concluintes do ensino médio e mesmo
a universitários.
Semelhante constatação foi verificada num teste internacional
de compreensão de texto, que envolveu 32 países, no qual o Brasil
ficou em último lugar.
Manipulação da mídia, baixa
escolaridade e descrença nos políticos fazem com que o primeiro
lugar de Supla entre os jovens seja, por incrível que pareça, absolutamente previsível -esses ingredientes explicam, em maior ou
menor grau, o fenômeno representado por Roseana Sarney, que
fez do horário eleitoral gratuito
sua "Casa dos Artistas".
Revelam-se uma sociedade intelectualmente indigente e um jovem politicamente despreparado,
mas, ao mesmo tempo, um eleitor
com senso crítico, que pede mais
responsabilidade na vida pública.
PS - A íntegra da pesquisa da
CPM Market Research está no
www.aprendiz.org.br. Também
estão lá investigações sobre os desejos, as ansiedades e as perspectivas do jovem brasileiro.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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