São Paulo, sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006

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MASSACRE DO CARANDIRU

Advogado de Ubiratan diz que grupos de direitos humanos elegeram coronel como bode expiatório

Governo teme repercussão no exterior

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA SUCURSAL DO RIO
DA REPORTAGEM LOCAL


O governo federal, por meio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, se manifestou ontem com preocupação sobre a decisão da Justiça paulista de inocentar o coronel Ubiratan Guimarães. O Palácio do Planalto, que diz contar com a insistência do Ministério Público no caso, teme que a absolvição tenha repercussões negativas no exterior.
"A decisão preocupa particularmente esta secretaria tendo em vista que o caso foi objeto de recomendações pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos [OEA]. O relatório da comissão, elaborado em 2000, responsabiliza o Estado brasileiro por violação aos direitos humanos e pede uma investigação completa, imparcial e efetiva a fim de identificar e processar as autoridades e funcionários responsáveis pelo ocorrido", informou a secretaria, em nota.
Para não polemizar com o Judiciário, o governo condena o resultado de forma sutil, dizendo que "reconhece a soberania e a legitimidade" das decisões da Justiça.
Para Viviana Krsticevic, do Centro pela Justiça e Direito Internacional -uma das ONGs que levaram o caso à OEA-, a falta de punição até o momento pode levar o Brasil a receber uma moção de censura do órgão.
"Em abril de 2002, a comissão obrigou o Estado brasileiro a punir os responsáveis pelo massacre do Carandiru. A decisão não diz que essa ou aquela pessoa tem que ser culpada, mas responsabiliza o Estado brasileiro pela investigação e punição dos culpados. Obviamente, uma decisão como essa [a absolvição] promove e perpetua a impunidade e a recorrência de atos violentos no sistema carcerário brasileiro", diz.
O papel da comissão é o de fazer recomendações para os países americanos a partir de casos de violações aos direitos humanos.
A Anistia Internacional divulgou nota ontem em que afirma que a Justiça do país "falhou ao permitir que uma grave violação aos diretos humanos passasse impune". "Com esta decisão, ninguém foi responsabilizado pelas 111 mortes. Isso é uma afronta às vítimas e aos familiares", afirmou Tim Cahill, pesquisador da Anistia Internacional no Brasil.
Procurado pela reportagem, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, não comentou a decisão da Justiça paulista.

Equívoco
O advogado do coronel Ubiratan Guimarães, Vicente Cascione, deputado federal pelo PTB-SP, afirma que a decisão do Tribunal de Justiça apenas corrigiu um equívoco cometido pela juíza Maria Cristina Cotrofe na interpretação dos votos dos jurados.
"O que eu sustentei ontem [anteontem] foi que o júri já havia absolvido o coronel. O júri já havia negado o dolo (intenção), já tinha afirmado o estrito cumprimento do dever legal, afirmado que era inexigível outra conduta [por parte do coronel]", afirmou.
Sobre as críticas de que a decisão possa contribuir para o crescimento da sensação de impunidade no país, Cascione afirmou: "Absolver o inocente não significa impunidade. Impunidade significa não punir culpado".
Para o advogado, as entidades de direitos humanos que protestam contra a absolvição do coronel elegeram o oficial para "bode expiatório". "Ele não tinha outra saída senão cumprir ordens", afirmou Cascione.


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