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VIOLÊNCIA
Blindado da Polícia Militar, conhecido como "caveirão", sobe morro de área rica pela primeira vez no Rio de Janeiro
Áreas nobres viram rota de fuga do tráfico
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
"Enfim, nos integramos à "comunidade". Somos uma favela
só", disse a artista plástica Ana
Torres, moradora do Alto Leblon,
ao se deparar, ontem pela manhã,
com grupos de policiais com fuzis
em punho circulando pelo bairro,
um dos mais sofisticados do Rio
de Janeiro, onde, segundo informação de corretores, o metro
quadrado dos imóveis custa no
mínimo R$ 5.000.
Foi um dia atípico no bairro,
que fica no final do Leblon, na zona sul da cidade. Segundo os moradores, pela primeira vez, o "caveirão" -carro blindado do Bope (Batalhão de Operações Especiais, da Polícia Militar), usado
para transportar policiais nas incursões pelas favelas- subiu suas
ruas íngremes e arborizadas.
Os blindados de cor preta, com
caveiras (símbolo do Bope) pintadas nas portas, eram observados à
distância pelos moradores, que
passaram por grande susto no início da manhã.
Por volta das 7h, bandidos armados com fuzis e metralhadoras, que haviam participado da
tentativa de invasão da favela da
Rocinha e se refugiado na mata
densa do parque Dois Irmãos,
atravessaram o portão que separa
o parque do bairro e ganharam as
ruas Timóteo da Costa e Sambaíba. A constatação de que o Parque
Dois Irmãos pode ser usado como
rota de fuga, a partir da Rocinha,
foi uma surpresa para a presidente da Comunidade do Alto Leblon
(associação dos moradores), a advogada Evelyn Rosenzweig, que
mora há 25 anos no bairro.
"Mudou o perfil da insegurança. Há dois anos, sofríamos com
os assaltos às residências, que nos
aterrorizavam nos finais de semana. Os moradores se mobilizaram
e conseguiram patrulhamento.
Agora, a insegurança é no atacado. Meu receio é de que o Alto Leblon vire rota de fuga de traficantes em guerra", diz a advogada.
O Alto Leblon tem 2.500 unidades residenciais, entre casas e
apartamentos, e nenhum estabelecimento comercial. O único
ponto de comércio do bairro é
uma banca de jornais.
A população, de alto poder
aquisitivo, sempre se mobilizou
para defender a qualidade de vida. Em 1994, os moradores se cotizaram para erradicar uma favela
que estava se formando dentro do
Parque Dois Irmãos. Juntaram o
equivalente a US$ 250 mil e recompraram os barracos das 42 famílias que haviam se instalado no
local. As construções foram derrubadas e a mata, recuperada.
Também por iniciativa dos moradores, foi montado um sistema
de transporte, com dois microônibus, exclusivamente para levar
moradores e empregados até a
avenida Ataulfo de Paiva, no Leblon. As famílias pagam um valor
mensal pelo serviço.
Noite do medo
A presidente da Comunidade
do Alto Leblon disse que foi avisada, anteontem à noite, de que os
traficantes haviam entrado no
Parque Dois Irmãos. O aviso foi
dado pelo presidente da Associação dos Moradores do Alto da Gávea, o também advogado Luiz
Fernando Penna. A mulher dele
viu quando os bandidos, que vinham em retirada da Rocinha,
quebraram o cadeado do portão
de ferro que dá acesso ao parque
pela rua Caio Mário.
""Só então me dei conta de que a
distância entre o Alto Leblon e a
Rocinha, pela mata, é de apenas
800 metros", afirmou Evelyn.
No Alto da Gávea, outro reduto
de famílias de alto poder aquisitivo, já é rotina os tiroteios entre
polícia e traficantes, o que levou a
forte desvalorização dos imóveis.
A possibilidade de que o mesmo
ocorra no Alto Leblon era um dos
receios dos moradores ontem.
A artista plástica Ana Torres teme que seu apartamento, avaliado em R$ 1 milhão, se deprecie.
Critica a falta de segurança também para os moradores das favelas. Ela se refere aos moradores
das favelas da Rocinha, Vidigal e
da Chácara do Céu, as mais próximas do Alto Leblon, como ""os vizinhos abandonados", e defende
a legalização da venda de drogas
para neutralizar o tráfico.
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