São Paulo, terça, 17 de fevereiro de 1998

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EDUCAÇÃO
Calouros de Geologia da USP foram induzidos pelos veteranos a beber aguardente no primeiro dia de aula
Trote leva 5 alunos alcoolizados ao hospital

Ormuzd Alves/Folha Imagem
Calouros de geologia da USP tentam levantar colega que foi induzido por veteranos a tomar aguardente no primeiro dia de aula


LUCIA RODRIGUES GONÇALVES
free-lance para a Folha



Cinco calouros do Instituto de Geociências da USP (Universidade de São Paulo) foram hospitalizados ontem no HU (Hospital Universitário) após terem sido submetidos a trote pelos veteranos.
Os estudantes foram induzidos a tomar aguardente no primeiro dia de aula da faculdade. Segundo o superintendente do HU, Erasmo Magalhães Castro de Tolosa, eles estavam com intoxicação alcoólica aguda e depressão profunda.
Pelo menos dois chegaram ao hospital inconscientes por volta das 12h. Um dos estudantes, P. H. P., tem 17 anos.
Eles tomaram soro glicosado e o álcool foi rapidamente metabolizado, afirmou o médico Tolosa. Às 18h, todos já haviam recebido alta. O médico disse que já se acostumou a receber estudantes alcoolizados todo o início de ano devido aos trotes.
A Folha presenciou o trote logo pela manhã. Por volta das 9h, um grupo de estudantes veteranos invadiu a sala de aula no térreo, onde os calouros assistiam a uma aula trote, tocando bumbos e gritando. Os veteranos carregavam garrafões e garrafas com pinga e induziam os calouros a beber.
Quando eles se recusavam a beber, os veteranos pressionavam gritando bem alto: "Bebe, bebe, bebe." Apenas um calouro conseguiu convencê-los de que não poderia beber porque a bebida lhe fazia mal.
Um dos estudantes, que disse se chamar Osni Hoffman, 18, já estava completamente bêbado por volta das 10h30. Não conseguia nem sequer andar e foi carregado ao hospital pelos próprios veteranos. "Estou me sentindo mal demais. Dói tudo", afirmava.
Um calouro, Conrado Picolo, 19, tentou escapar, mas foi resgatado pelo veterano que o trouxe novamente para a sala de aula. "Já estou de saco cheio de trote. Já levei trote em casa e no dia da matrícula." Para sair da sala, os estudantes tiveram que dançar sobre uma mesa e repetir várias vezes que eram "burros".
Só então foram conduzidos à sala de convivência do Centro Acadêmico, onde receberam o chamado batismo (nome dado ao ritual no qual o calouro recebe um apelido).
Os calouros tiveram que vestir sacos de estopa e se ajoelhar na frente dos veteranos para receber o novo nome.
O presidente do centro acadêmico, Rafael Hernandes, 24, disse que o trote não é violento. "Sofri isso na minha época e foi maravilhoso. Foi aí que conheci todo mundo. É legal quando você se integra."
Segundo ele, o calouro "se sente um Deus" após ter passado no vestibular da USP. "O trote é importante para mostrar que ele é igual a todo mundo", disse.



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