|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DANUZA LEÃO
A maneira mais difícil
As coisas não andavam lá
muito boas e uma bela tarde
ela disse que era melhor que se separassem; as mulheres, nessas horas, são bem decididas. Mais do
que os homens.
Ele não se mostrou surpreso,
não fez nenhuma pergunta nem
disse que sem ela não poderia viver, como aliás seria sua obrigação -ela achava. Botou umas
coisas na sacola, disse que depois
mandava buscar o resto, e foi.
Sozinha, ela sentou e chorou.
Não exatamente por ele, mas pelos sonhos que sonhou, pela vida,
por tudo.
Estava preparada para uma
longa e penosa cena que duraria
a noite toda, com acusações de
parte a parte e mágoas reprimidas; esperava, na melhor das hipóteses, que civilizadamente chegassem a um acordo sobre quem
ficava com quê. Mas não: ele aceitou com tanta facilidade que ela
imediatamente pensou "ele deve
ter outra" -o que é elementar,
na cabeça de uma mulher.
A partir desse momento, no lugar de passar a viver do jeito que
tinha sonhado -livre, sozinha,
independente-, começou a elucubrar e, consequentemente, a sofrer. Há muito tempo ele estava
indiferente; já devia estar de caso,
claro, e ela só não sabia com
quem. Investigou, perguntou aos
amigos e não descobriu nada.
Mas tinha certeza; intuição de
mulher nunca falha.
Mesmo com esse grilo na cabeça
foi em frente, e depois de duas ou
três experiências sentimentais (?)
desastrosas, em todos os sentidos,
começou a achar que tinha feito
uma grande bobagem. Voltou a
fita e pensou: talvez tenha sido
precipitada, influenciada pelas
amigas -as descasadas, claro.
Daí para descobrir que era
apaixonada por ele e que tudo
não havia passado de uma crise
que poderia ter sido contornada
foi simples.
Arranjar uma desculpa e telefonar foi fácil: um dia para fazer
uma pergunta sobre o seguro do
carro, no outro uma gentileza do
tipo se ele não queria ficar com
aquele quadro de que gostava
tanto, até que um dia propôs um
encontro para terem uma conversa -sem passionalismos nem ressentimentos.
Conversa de amigos -ou não
eram amigos?
Como boa estrategista, sugeriu
um lugar neutro, um restaurante,
e caprichou no visual, mas de maneira que ele não percebesse. No
terceiro copo de vinho falou alguma coisa e segurou na mão dele
num gesto casual, como fazem as
pessoas íntimas, e conseguiu não
cair da pose: disse que tinha que
acordar cedo e foi para casa -sozinha.
Mas o cerco continuou; ele, que
nunca soube do que é capaz uma
mulher, foi relaxando, e uma bela
noite foram parar num motel. Ela
sentiu o sabor da primeira vitória: acabar com o romance que
ela achava que ele estava vivendo. Achava não: tinha certeza.
Depois do primeiro fim de semana que passaram fora, a cerimônia acabou, e ele começou a
dormir, com frequência, na casa
que havia sido dele; daí para fazer as malas e voltar foi fácil.
Um belo dia, ela perguntou e ele
disse a verdade: que quando se separaram não estava de caso com
ninguém. E foi tão sincero que ela
acreditou. No dia seguinte, depois
que ele saiu, ela ficou matutando;
tinha voltado por amor ou para
testar sua força? Lembrou que
não era a primeira vez que brigava por um homem para depois
descobrir que estava mesmo é
querendo saber quem era mais
forte, ela ou a outra.
Pensando bem, a vida inteira
ela só se interessou por homens
casados ou pelo menos comprometidos.
Porque o amor, para ela, nunca
teve tanta importância. Bom
mesmo era a competição.
E-mail -
danuza.leao@uol.com.br
Texto Anterior: Pesquisas mostram efeito devastador Próximo Texto: Há 50 anos Índice
|