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MOACYR SCLIAR
Hora da verdade
A disputa para o concurso
"Mãe de todas as mães" está
cada vez mais acirrada. É como se
estivesse em jogo a hegemonia
mundial, e, num certo sentido, é o
que está em jogo, sim, a hegemonia mundial.
No começo, estavam inscritas
muitas mães, mas todas foram
sumindo. A "Mãe-Natureza", por
exemplo, simplesmente desapareceu, sem nem sequer cancelar a
sua inscrição. Nos bastidores da
disputa comenta-se, a boca pequena, que tais sumiços não ocorrem por acaso. Que fazem parte
de um plano para eliminar rivais.
Seja como for, o certo é que sobraram apenas duas concorrentes. Uma é a "Mãe de todas as batalhas". Seu grande promotor é o
senhor Saddam Hussein, veterano destas provas. Na verdade, a
"Mãe de todas as batalhas" está
concorrendo pela segunda vez;
trata-se, pois, de uma veterana. O
primeiro concurso em que participou, há cerca de uma década, teve resultado indefinido, motivo
pelo qual está se apresentando pela segunda vez.
A outra concorrente é a "Mãe
de todas as bombas", promovida
pelo senhor George Bush. É a sua
estréia em provas deste gênero,
mas ela está confiante na vitória e
mais, numa vitória rápida, arrasadora. Como declarou à mídia,
numa apresentação prévia feita
na Flórida, quer simplesmente
terminar com a "Mãe de todas as
batalhas".
Recentemente houve uma apresentação pública das duas candidatas, um fato que teve ampla repercussão na mídia. Cada uma
veio acompanhada de um imenso
séquito belicoso. A "Mãe de todas
as batalhas" trouxe a "Guerra
química", a "Guerra bacteriológica", a "Eliminação de todos os
adversários", todas diletas discípulas. A "Mãe de todas as bombas", mais jovem, optou por trazer as suas mestras, a "Bomba
atômica", a "Bomba de hidrogênio" e outras (todas, aliás, invejadas pela "Mãe de todas as batalhas", que já tentou, sem êxito,
obter estas duas mestras para a
sua escola).
As duas candidatas adotam estratégias diferentes. A "Mãe de
todas as bombas" confia no seu
poder explosivo no poder, de maneira geral, e sustenta que, ao fim
e ao cabo, é assim que as coisas se
resolvem. A "Mãe de todas as batalhas" aposta no desgaste da
concorrente, cuja imagem não é
das melhores.
O júri está em reunião permanente para decidir a quem será
conferido o prêmio. Decisão difícil. Como disse, baixinho, um dos
jurados: com mães desse tipo, o
melhor é ser órfão.
O escritor Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de
ficção baseado em matérias publicadas
no jornal.
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