São Paulo, quarta-feira, 17 de março de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SEGURANÇA

Ação foi represália contra morte de traficante ligado ao Comando Vermelho, que controla o morro do Cajueiro

No Rio, tráfico impõe toque de recolher

André Teixeira/Agência "O Globo"
Na principal avenida de Madureira e nos arredores, cerca de 150 estabelecimentos, entre lojas e escolas, fecharam as portas


MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Traficantes do morro do Cajueiro impuseram um toque de recolher no final da manhã de ontem nos bairros de Madureira e Vaz Lobo, na zona norte do Rio. Em plena luz do dia, cerca de 150 estabelecimentos- entre lojas, escolas e igrejas evangélicas- que ficam em um trecho de 1 km da avenida Ministro Edgard Romero foram obrigados a fechar as portas mais cedo.
A avenida é um dos principais centros comerciais do subúrbio carioca. O trecho onde ocorreu o problema fica a apenas 200 metros da 29ª Delegacia de Polícia.
O motivo da ordem para o fechamento foi um luto forçado pela morte do traficante Hermes da Mota Silveira Neto, 31, apontado pela polícia como o chefe do tráfico no Cajueiro, que é controlado pela facção criminosa CV (Comando Vermelho).
Segundo a Polícia Civil, Silveira foi assassinado no dia 14 de fevereiro em Jacarepaguá (zona oeste), mas sua morte só foi descoberta anteontem. De acordo com a titular da 29ª Delegacia de Polícia, Márcia Julião, o traficante foi enterrado como indigente no dia 3 de março e a mulher reconheceu o corpo por foto na segunda-feira.

Homem de bicicleta
De acordo com comerciantes e moradores, a ordem para fechar os estabelecimentos foi dada por volta das 10h30 e transmitida por um homem que passava de bicicleta pela Edgard Romero e ruas próximas a avenida.
Segundo testemunhas, após a ordem ter sido transmitida, alguns olheiros do tráfico circularam pelo bairro para conferir se as lojas estavam fechadas. Eles falavam pelo celular com cúmplices sobre o cumprimento da ordem.
Por efeito dominó, os que não foram ameaçados diretamente acabaram encerrando o expediente mais cedo.
No início da noite, a Secretaria de Segurança Pública informou que prendeu um menor de 15 anos apontado como o responsável por mandar os comerciantes fecharem as portas. Ele teria agido a mando dos traficantes.
Instituições tradicionais, como o Colégio Bahiense e a Escola Estadual Carmela Dutra, funcionaram pela manhã, mas tiveram que dispensar os alunos mais cedo. Não houve turno da tarde. Só no Carmela Dutra, cerca de 3.000 alunos ficaram sem aula.
Três escolas municipais -Astolfo Rezende, Luís Carlos da Fonseca e Manacéia de Andrade- também dispensaram os estudantes. O curso de línguas CCAA e postos do Detran (Departamento Estadual de Trânsito) foram outros que baixaram as portas, assim como postos de gasolina, restaurantes, padarias e cursos profissionalizantes. Por volta do meio-dia, somente vendedores ambulantes e funcionários da Prefeitura do Rio trabalhavam no local, mas eles disseram que não viram nada.
O horário em que foi iniciado o toque de recolher surpreendeu muita gente. Muitos estudantes saíram às pressas das escolas com medo de tiroteios. Outros chegavam para a aula e eram avisados por colegas ou funcionários de que as escolas estavam fechadas. Com medo de represálias, ninguém quis se identificar.
Apesar do clima tenso no local, a Folha constatou que apenas três carros da PM (Polícia Militar) ficaram parados em pontos da Edgard Romero para garantir a segurança dos comerciantes e escolas. Outros veículos da corporação circulavam pela avenida.
Responsável pelo policiamento na região, o tenente-coronel Francisco Murilo Lyra, afirmou que a corporação reforçou a segurança nas proximidades do morro do Cajueiro e que quem fechou as portas o fez porque quis. Segundo ele, havia dez carros da polícia no local, cada um com cinco policiais, na sua visão, era suficiente.
A Edgard Romero é rodeada por três favelas (Cajueiro, Congonha e Serrinha).


Texto Anterior: Há 50 anos: EUA não atuarão sozinhos, diz Dulles
Próximo Texto: Saúde: Minas indicia 2 por mortes pelo Celobar
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.