São Paulo, terça-feira, 17 de abril de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARILENE FELINTO

A cara feia da elite do Norte/Nordeste

Corruptos, incultos e feios: esta a imagem que a elite política e econômica do Norte e do Nordeste passa para o resto do país. De políticos a empresários e usineiros, eles não inspiram a menor confiança. A classe política, embora seja corrupta em todo lugar -basta lembrar as suspeitas nunca esclarecidas que pairam sobre políticos de São Paulo, de Orestes Quércia ao ex-governador Fleury até a recente dupla dinâmica Paulo Maluf/Celso Pitta, para citar apenas alguns-, nunca pareceu tão subornável quanto a do Norte/Nordeste que hoje estampa os noticiários.
A começar pela predatória "república das Alagoas", de Fernando Collor e sua matilha de cães famintos pelo dinheiro público, passando pela sempre suspeita Bahia de Antonio Carlos Magalhães, alcançando o Pernambuco e o Ceará da Sudene, chegando ao Pará de Jader Barbalho e sua Sudam, a gente lá de cima oferece um espetáculo sem precedentes na história do lamaçal que é a administração da coisa pública brasileira.
Por que somente agora se fala no rombo da Sudene e da Sudam? A rede de corrupção e espoliação está instalada há décadas nessas duas instituições. Em Pernambuco, até pequenos funcionários da Sudene enriqueceram de um dia para o outro nos anos 70/80.
Imagine o que não se passa nas reentrâncias da selva amazônica, sob domínio de caudilhos disfarçados de empresários e homens públicos, um Jader Barbalho, um Amazonino Mendes. Ali eles mandam em tudo, sem nenhuma vigilância. Até o Ministério Público do Pará parece dominado por Barbalho: a Promotoria não se mostra disposta a apurar até o fim o desvio de R$ 10 milhões do Banpará, o banco estadual, para contas do senador e de aliados.
Numa única visita que fiz a Belém, há dois anos, impressionou-me a fala do taxista (ou seja, a "voz do povo") que me levava do aeroporto ao hotel: "está vendo aquela antena de televisão?", disse, apontando para o alto de um morro. "É do Jader Barbalho. Aqui ele é dono de TV, de tudo, manda em tudo." O tom era um misto de fatalismo com revolta.
Qual a diferença entre Jader Barbalho e ACM? Exatamente esta: que, quando se chega a Belém, é o taxista que dá a senha; quando se chega a Salvador, a coisa é oficial, está no nome do aeroporto (homenagem póstuma ao filho de ACM, Luís Eduardo Magalhães); os baianos já incorporaram a submissão ao senador como um emblema em suas testas.
Como a Amazônia fica longe -e o Nordeste também fica longe, visto daqui do Sudeste-, é como se lá eles tivessem mais liberdade para agir. Não é à toa que se descobriu só agora lá no Norte o maior latifundiário do país, Falb de Farias, suposto grileiro de terras, dono de quase metade do Amazonas.
O rombo na Sudam chega perto de R$ 2 bilhões. O do Finor (Fundo de Investimentos do Nordeste) a R$ 1,4 bi. Só da Sudene foram desviados quase R$ 500 milhões. E assim vai. De bilhão em bilhão, a população do Norte/Nordeste vai morrendo à míngua, enquanto a mais predadora das elites do país enche os bolsos.
A cara feia dos políticos do Norte/Nordeste só varia de forma: do estilo "bebe quieto" de um Tasso Jereissati à truculência de um ACM ou de um Jader Barbalho. No fundo, são todos iguais: é a chamada "integração nacional", nome do ministério criado pelo governo Fernando Henrique. A lógica é a seguinte: quem manteve um ACM na presidência do Senado pode manter um Jader. Por que não? Qual a diferença? É tudo integração.
E-mail - mfelinto@uol.com.br




Texto Anterior: Trabalho infantil: Crianças recolhem restos de carne
Próximo Texto: Há 50 anos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.