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Injeção de sangue vira mania no país e preocupa médicos
Anvisa alerta que a prática é arriscada e sem comprovação científica e manda punir estabelecimento que fizer aplicações
Pacientes estariam abandonando o tratamento convencional para adotar a terapia, colocando a saúde em risco, segundo médicos
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um tratamento ilegal, que
envolve injeções de sangue e
vem sendo difundido pela internet, virou febre no país e
motivo de preocupação para os
médicos. Pacientes estariam
abandonando os tratamentos
convencionais e adotando a terapia mesmo sem nenhuma
comprovação científica dos benefícios ou da segurança.
A "auto-hemoterapia" (AH)
consiste em retirar uma quantidade de sangue da veia e injetar no músculo da mesma pessoa. A promessa é de cura ou
alívio dos sintomas de doenças
que vão de rinites e dermatites
ao câncer e a Aids.
Na última sexta-feira, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou uma
nota técnica alertando que a
prática poderá causar reações
adversas, imediatas ou tardias,
de gravidade imprevisível.
Também determina que as vigilâncias sanitárias estaduais
adotem medidas legais cabíveis
-de multas ao fechamento do
local que oferece a terapia.
Para Carlos Chiattone, presidente da Sociedade Brasileira
de Hematologia e Hemoterapia, a curto prazo a prática pode
oferecer perigos de infecção.
"Antes de ser injetado, o sangue
pode se contaminar. A longo
prazo, ninguém sabe."
Chiattone diz estar assustado com a "divulgação assombrosa" na internet. "O paciente
não deve se iludir e parar o tratamento convencional."
A auto-hemoterapia tem sido
praticada em farmácias ou por
profissionais que vão até a casa
da pessoa aplicar a injeção.
Recentemente, a Vigilância
Sanitária de Criciúma (SC) fechou uma farmácia que fazia o
procedimento. O dono respondeu a inquérito policial e o caso
está no Ministério Público.
A Folha apurou que em uma
farmácia em Goiânia (GO) há
pelo menos mil pessoas fazendo o "tratamento". Um deles é
A.H.C., 32, que afirma ter feito
seis aplicações de sangue para
curar bronquite asmática.
"Não tive mais crise e deixei de
usar os inaladores."
Na internet, fóruns de discussão mostram que a prática
está disseminada no país.
O técnico em enfermagem
Luiz, que trabalha em dois hospitais municipais de Porto Velho (RO), conta em um desses
fóruns que aplica semanalmente 40 injeções de auto-hemoterapia em vizinhos.
O CFM (Conselho Federal
de Medicina) divulgou um alerta condenando o procedimento, embora o maior incentivador seja um médico: Luiz Moura, 83, do Rio de Janeiro, que
produziu um vídeo em que explica como fazer o tratamento
ao qual atribui várias curas.
Procurado pela Folha por telefone, Moura não foi encontrado no seu consultório. Uma
mensagem eletrônica gravada
diz que ele não está atendendo.
O Cremerj (conselho de medicina do Rio de Janeiro) informa que não pode dizer se Moura está sendo investigado.
Desde 1911
No Brasil, os primeiros registros sobre a prática da auto-hemoterapia para tratar enfermidades como a febre tifóide datam de 1911 e foram escritos por
F. Ravaut, segundo o médico
Luiz Moura, em artigo no site
da Associação Brasileira de Medicina Complementar.
Ele afirma que entre 1943 e
1947, quando cursava a Faculdade Nacional de Medicina
(RJ), aplicou a terapia em pacientes que seu pai operava na
Casa de Saúde São José.
Segundo Moura, o objetivo
era evitar infecção. Depois, ele
diz ter aplicado a auto-hemoterapia em casos de acne juvenil
e, a partir de 1976, em outras
doenças.
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