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OPINIÃO
O problema não é o PCC
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
Apesar de ter demonstrado um extraordinário poder de articulação e de ter paralisado a mais importante cidade
brasileira, o PCC é somente um ínfimo detalhe da insegurança nacional. Pouco adiantará destruí-lo
enquanto não se diminuir a
quantidade de mão-de-obra disponível ao crime organizado -essa deveria ser uma das principais
lições dessa onda de ataques e
mortes.
É uma mão-de-obra sem perspectiva de vida e, por isso, seduzida a qualquer risco, como vimos
nos ataques. O problema mesmo
está no fato de que, na região metropolitana de São Paulo, existem
3,4 milhões de jovens entre 15 e 24
anos de idade, dos quais 950 mil
nem estudam nem trabalham. Estimativas oficiais indicam que, em
todo o país, esse número subiria
para 7 milhões.
A taxa média de desemprego no
Brasil é alta. É maior ainda entre
os jovens e especialmente elevada
entre aqueles das regiões periféricas. Juntem-se, então, a energia de
sobra e o emprego de menos para
que resulte na combustão da criminalidade.
Para piorar, somem-se a desestrutura familiar, o pouco acesso a
lazer e a cultura, além da escassez
e da péssima qualidade dos serviços de saúde. Temos assim os guetos, nos quais, muitas vezes, a polícia é vista como corrupta e violenta e os líderes de gangues, exemplos de sucesso.
O crime organizado do PCC é
somente conseqüência da sociedade desorganizada dos guetos. Se
acabarem com o PCC, surgirá um
outro bando -com líderes tão ou
mais articulados e ferozes-, pela
simples razão de que se estaria
atacando a conseqüência e não a
causa.
Qualquer indivíduo com um
mínimo de vivência nos morros e
favelas sabe disso. Também de
pouco adiantará apostar apenas
no crescimento econômico. A
imensa parte daquela mão-de-obra terá dificuldade, devido à
baixa escolaridade, para se colocar no mercado de trabalho. A esta altura, não existe solução ideal,
mas apenas a redução do dano, e
isso significa fazer o que deu certo
em muitos lugares. Focar as áreas
conflagradas, numa combinação
de repressão e policiamento comunitário com ações dos mais variados níveis de governo (federal,
estadual e municipal), para promover qualificação educacional e
profissional.
Tal obra de engenharia social dá
trabalho, leva tempo, exige a formação de uma liderança comunitária, mas é a única resposta consistente ao crime organizado.
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