São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 2006

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OPINIÃO

O problema não é o PCC

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Apesar de ter demonstrado um extraordinário poder de articulação e de ter paralisado a mais importante cidade brasileira, o PCC é somente um ínfimo detalhe da insegurança nacional. Pouco adiantará destruí-lo enquanto não se diminuir a quantidade de mão-de-obra disponível ao crime organizado -essa deveria ser uma das principais lições dessa onda de ataques e mortes.
É uma mão-de-obra sem perspectiva de vida e, por isso, seduzida a qualquer risco, como vimos nos ataques. O problema mesmo está no fato de que, na região metropolitana de São Paulo, existem 3,4 milhões de jovens entre 15 e 24 anos de idade, dos quais 950 mil nem estudam nem trabalham. Estimativas oficiais indicam que, em todo o país, esse número subiria para 7 milhões.
A taxa média de desemprego no Brasil é alta. É maior ainda entre os jovens e especialmente elevada entre aqueles das regiões periféricas. Juntem-se, então, a energia de sobra e o emprego de menos para que resulte na combustão da criminalidade.
Para piorar, somem-se a desestrutura familiar, o pouco acesso a lazer e a cultura, além da escassez e da péssima qualidade dos serviços de saúde. Temos assim os guetos, nos quais, muitas vezes, a polícia é vista como corrupta e violenta e os líderes de gangues, exemplos de sucesso.
O crime organizado do PCC é somente conseqüência da sociedade desorganizada dos guetos. Se acabarem com o PCC, surgirá um outro bando -com líderes tão ou mais articulados e ferozes-, pela simples razão de que se estaria atacando a conseqüência e não a causa.
Qualquer indivíduo com um mínimo de vivência nos morros e favelas sabe disso. Também de pouco adiantará apostar apenas no crescimento econômico. A imensa parte daquela mão-de-obra terá dificuldade, devido à baixa escolaridade, para se colocar no mercado de trabalho. A esta altura, não existe solução ideal, mas apenas a redução do dano, e isso significa fazer o que deu certo em muitos lugares. Focar as áreas conflagradas, numa combinação de repressão e policiamento comunitário com ações dos mais variados níveis de governo (federal, estadual e municipal), para promover qualificação educacional e profissional.
Tal obra de engenharia social dá trabalho, leva tempo, exige a formação de uma liderança comunitária, mas é a única resposta consistente ao crime organizado.


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