São Paulo, Sábado, 17 de Julho de 1999
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LETRAS JURÍDICAS
500 anos de advocacia

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Mantendo a promessa de repassar até abril próximo fatos e gentes dos 500 anos de Brasil, trato hoje dos advogados. Durante séculos os advogados de Coimbra, São Paulo, Olinda e Rio dominaram nossa vida cultural e política. O espaço é pequeno para falar deles, mas cabe um resumo. Os bronzes com nomes de ex-alunos nas arcadas da faculdade do largo de São Francisco mostram ao visitante quanta gente ilustre passou por lá, desde poetas como Castro Alves a juristas do porte de Ruy Barbosa e políticos.
Antes de 1808 e até a vinda da corte portuguesa, a influência dos bacharéis não foi tão grande, salvo em movimentos libertários. Na Inconfidência Mineira, Tiradentes era militar, mas quase todos os demais tinham formação jurídica. Thomaz Antonio Gonzaga, provedor da Fazenda dos Defuntos e Ausentes de Vila Rica, seria hoje um promotor. Faleceu, no exílio, em Angola. Advogado e juiz, Claudio Manoel da Costa morreu na prisão. Na rebelião pernambucana de 1817, um dos líderes, o advogado José Luis de Mendonça, foi condenado à morte e executado, ao fracassar o movimento.
No começo do Brasil colônia, os donatários de terras, concedidas pelos reis portugueses, terminaram assessorados por juristas, de vez que também recebiam autorização para exercerem todas as funções da Justiça ou nomearem pessoas de sua confiança que o fizessem.
A Proclamação da Independência deveu-se em grande parte ao advogado José Bonifácio de Andrada e Silva (1763/1838), santista, formado em Coimbra. Influiu sobre o príncipe dom Pedro de Alcântara, estimulando o rompimento com Portugal. Na libertação dos escravos, foram muitas as grandes vozes dos advogados e jornalistas na campanha.


O país não é mais o Brasil dos bacharéis, mas despontam jovens valores.

Quase todos os presidentes civis da República eram formados em direito, como também foi o ditador Getúlio Vargas, que contou com o apoio jurídico de Francisco Campos. Professores da Faculdade de Direito de São Paulo, como Luiz Antonio da Gama e Silva e Alfredo Buzaid, deram estrutura jurídica ao regime militar (1964/1985). Na criação das leis, naturalmente, a presença dos juristas foi dominante. José Clemente Pereira relatou o Código Comercial de 1850. Alcântara Machado foi a grande figura na criação do Código Penal de 1940, ainda vigorante, na parte especial. Sobrevivem muitos artigos do maior monumento jurídico da língua portuguesa, nosso Código Civil, em projeto de Clovis Bevilaqua, sem esquecer o Código Civil argentino, baseado no projeto brasileiro de Teixeira de Freitas.
O Instituto dos Advogados de São Paulo, a mais antiga sociedade profissional do Estado, foi fundado em 1874, por Joaquim Ignacio Ramalho, Barão de Ramalho. Há especial curiosidade histórica na vida de Ramalho. Teve forte presença na construção do edifício onde se acha o Museu do Ipiranga. Sem sua inesgotável energia, não teria sido erguido. A comunidade paulistana era contrária aos gastos com o prédio, em cidade carente de obras essenciais. Iniciada em 1827, interrompida e retomada várias vezes, prestando-se a muitas discussões sobre aplicação e desvio das verbas, a obra tomou rumo firme, com Ramalho, a partir de 1877.
Hoje a advocacia deve contar com 400 mil inscritos na OAB, com cerca de 130 mil neste Estado. Houve extraordinário crescimento quantitativo, com quebra de qualidade provocada pelo ensino deficiente e rebaixamento dos padrões éticos e culturais. O país não é mais o Brasil dos bacharéis, mas despontam jovens valores, na profissão e na política, sugerindo que economistas e sociólogos não perdem por esperar a nossa volta.


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