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PASQUALE CIPRO NETO
O cálculo do inimaginável
Está chegando o Enem
(Exame Nacional do Ensino
Médio). Uma das palavras de ordem -corretamente exigida pelo
MEC- é interdisciplinaridade.
No Enem, nem há mais a clássica
divisão das questões por matéria.
Um teste pode abordar matemática e português ao mesmo tempo.
Na verdade, em muitos concursos públicos isso já é feito, há um
bom tempo. É clássica, por exemplo, uma questão da Fuvest em
que se pedia o quadrado de 10%.
Antes de ser de matemática
-ou física, química, biologia-,
qualquer questão é de texto. Os
apressadinhos ou distraídos vão
logo dizendo que a resposta é
100%. Afinal, o quadrado de um
número é ele multiplicado por ele.
Esquecem-se de um detalhe, linguístico-matemático: 10% é diferente de 10. A preposição "por" da
expressão "por cento" estabelece
idéia de relação, ou seja, 10% significa 10 em relação a 100, o que,
evidentemente, não equivale a 10.
A expressão 10% é equivalente
a 10/100, que, como se sabe, equivale a 1/10. Então o quadrado de
10% é o quadrado de 1/10. Faça a
conta. O resultado? 1/100, ou seja,
1 em relação a 100, ou seja, 1%.
Não se assuste, não. Não virei
professor de matemática, mas
não abro mão de ser professor de
texto, de raciocínio lógico ou de
algo equivalente.
Já que falamos de portumática,
vale a pena citar um caso bem interessante, do qual a imprensa
"gosta" muito. O repórter faz
uma matéria sobre preços. Vai a
uma loja e constata que lá a mercadoria custa R$ 90,00. Em outra
loja, custa R$ 30,00. Incontinenti,
dispara: "Na segunda loja, o produto custa três vezes menos".
Pense comigo, caro leitor. Se
custasse uma vez menos, já custaria zero, é claro. Portanto, se aqui
custa x e lá custa três vezes menos,
o cidadão não põe a mão no bolso
e, ainda por cima, sai da loja com
o produto e com dinheiro suficiente para comprar mais dois.
Percebeu o que ocorre? Na loja
que vende por menos, o produto
custa um terço do que custa na
outra, e não três vezes menos. Afinal, 30 é 1/3 de 90, e não três vezes
menos. Naquela em que custa R$
90,00, custa o triplo, e não três vezes mais. Se custa três vezes mais,
seu preço é R$ 120,00 (30 + três vezes 30). É por isso que só se pode
rir quando se ouve que algo diminuiu 150% ou que em outro lugar
tal coisa custa x vezes menos.
Pois bem. Como será possível,
então, que a violência diminua
7,25 vezes? Pois foi o que afirmou,
na semana passada, um candidato a prefeito de uma falida capital
brasileira, em nota enviada a um
grande jornal do país.
O engenheiro afirmou que em
gestão anterior "poupou dinheiro
público na Segurança e a violência diminuiu 7,25 vezes". Como
tudo neste país é obra dele, até o
inimaginável o é. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail - inculta@uol.com.br
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